Título: `Conspiração¿ ou blindagem?
Autor: Milton Temer
Fonte: Jornal do Brasil, 19/07/2005, Outras Opiniões, p. A11

Tarso Genro, acionando seu indiscutível talento retórico, anuncia medidas profundas, mínimas para a recuperação da identidade petista, ao substituir Genoino na presidência do partido. Em entrevista na Sorbonne, onde acompanhava o presidente Lula, afirmou defender um novo modelo econômico ''que gere distribuição de renda e um combate maior à desigualdade''.

Salutar, pela afirmação de autonomia em relação ao governo, não viesse a seguir o contraditório, emitido por ele mesmo: ''Porém, atenção, não se trata nem de substituir, já, o modelo do ministro Palocci, nem de promover uma ruptura''. Ou seja; mudemos tudo para tudo permanecer como antes.

Vem depois o próprio presidente Lula, numa patética entrevista, na França, que o Fantástico reproduziu se eximindo de responsabilidade no tatibitate das perguntas. Mas que revela, nas poucas respostas articuladas, o firme objetivo de jogar o PT às feras. Sem que o ''pai'' - porque assim ele se define em suas relações com a sigla - tivesse nada a ver com as ilegalidades do ''herdeiro''.

Francamente. Aí já é demais.

Primeiro: se há uma característica do PT, principalmente a partir da eleição de Zé Dirceu à sua presidência, é a absoluta subalternidade aos desígnios pessoais de Lula. Segundo: se havia alguém da total confiança de Lula, não era Dirceu. Era Delúbio Soares. Mesmo quando Dirceu aceitava algum tipo de concessão à esquerda, naquilo que vinha como ''prato feito'' do Instituto da Cidadania, era Delúbio quem votava contra, nas poucas reuniões deliberativas do Diretório Nacional. Para se manter fiel ao desejo original do ''pai''.

Se o presidente Lula deve ser blindado, que os interessados assumam. Mas sem escantear o que afirmou Olívio Dutra, em matéria de Fernando Exman, do Jornal do Brasil de sábado: ''(...) Acho que nós cometemos erros que têm de ser assumidos. Não é uma articulação de fora para dentro, contra o partido. Nós abrimos a guarda e facilitamos para que as coisas se desviassem por caminhos e condutas que não são da raiz, da estruturação e do balizamento do partido''. Olívio, todos lembram, foi quem definiu a opção de política de alianças como responsável pelas ''más companhias''.

Que o ouçam, portanto, intelectuais importantes, ora produzindo textos absolutamente desligados do contexto real, sobre golpes brancos contra o governo. E vou a exemplo específico, por conta da importância política do autor. Emir Sader, em artigo veemente, publicado na Folha de S.Paulo, denuncia conspiração da mídia, sugerindo bandeiras salvadoras: (o governo) ''Deve reconhecer o esgotamento da política econômica, com seus cruéis efeitos no plano social, propondo os eixos de uma alternativa onde possam prevalecer os pilares do 'outro mundo possível' com o qual a esquerda está comprometida e que já foram expressos no manifesto dos movimentos sociais, denominado Carta ao Povo Brasileiro''.

Só é possível Emir acreditar no cumprimento da exigência se não tiver levado em conta o ocorrido no dia imediato à entrega do documento - texto entregue pela CUT, MST, e outros menos ouvidos, ao presidente Lula, prometendo apoio ao governo, sob condição de ruptura com o modelo econômico, e alteração de fundo na política de alianças. Lula se fez fotografar em apertos de mão com Renan Calheiros e Michel Temer, prometendo, também, nomear ministros do PP de Severino Cavalcanti. Tudo simultâneo à entrevista onde Palocci, ao vivo e a cores, reafirmava a irreversibilidade do modelo econômico atual.

Deve também dar ouvidos a Olívio Dutra o acadêmico Wanderley Guilherme, para quem, a oposição estaria tentando desestabilizar o governo Lula, visando impedir-lhe a reeleição em 2006. Mas, e daí? Não é esse o papel legítimo das oposições? Oposições, sim, porque são duas as vertentes de confronto. Uma, de direita, protetora da sonegação Daslu, que não contesta - pelo contrário, sustenta ser essa a parte intocável do governo - o modelo macroeconômico. Oposição que só almeja disputar o controle do aparelho do Estado, para a execução da mesma política.

Existe, no entanto, outra oposição. De esquerda. Composta pelos que se consideram traídos com a rendição deLula e seu entorno. E que, a essa guinada ideológica, credita a manutenção dos instrumentos de privatização ilegal da coisa pública. Fundamental, portanto, mestres-pensadores, não misturar alhos com bugalhos. Não corresponde a vossos currículos de competência científica.