Título: Estatuto da Criança e do Adolescente: 15 anos no papel
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 19/07/2005, Rio, p. A15

Quinze anos depois da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), especialistas e representantes de menores denunciam que, no município do Rio, as leis não foram transformadas em políticas públicas. Para discutir problemas como crianças nas ruas e jovens infratores, cerca de 500 pessoas, entre elas, especialistas, juízes, promotores e organizações não-governamentais se reúnem hoje e amanhã na Uerj. Também participam do seminário ''15 anos do ECA: conquistas e desafios'' representantes dos municípios do interior e da Baixada Fluminense. Para o vice-presidente da Associação Beneficente Amar, Roberto Santos, um dos organizadores do seminário, a criação do ECA foi um avanço, mas, no Rio, ainda falta ''um entrosamento'' entre a sociedade civil e os governos municipal, estadual e federal. Segundo ele, há quatro anos a ONG não consegue um lugar para atender 30 crianças que vivem nas ruas.

Por falta de espaço, os atendimentos são feitos numa praça de São Cristóvão.

- A sociedade civil e os governos se olham com desconfiança e isso traz dificuldades nas parcerias - constata Santos.

O representante da ONG cita como exemplo mal sucedido as instituições do Departamento de Ações Socioeducativas (Degase).

- O estado não se modernizou e as instituições não são capazes de recuperar o jovem em conflito com a lei, conforme prevê o ECA. Hoje, o que vemos é um sistema repressivo e um jovem que sai de lá ainda mais agressivo - diz Santos.

Segundo o diretor do Degase, que é vinculado à Secretaria Estadual da Infância e Adolescência, Sérgio Novo, 43% dos jovens infratores que cumprem as medidas sócio-educativas são recuperados. O sistema tem 2.300 internos e 30 unidades.

- Não devemos fazer apenas o diagnóstico dos percentuais. Precisamos entender que deve-se criar medidas preventivas e de ressocialização com iniciativas de todos os governos - frisa Novo, lembrando que o Degase não recebe verbas federais desde 2003.

Coordenador de Saúde do Degase, Hélio Ricardo Matos, conta que num levantamento com 775 menores que chegaram às instituições no primeiro semestre deste ano, constatou-se que 45% dos seus pais usam álcool ou outras drogas. A pesquisa mostra que 15% deles também fazem ou fizeram tratamento psiquiátrico. Entre os adolescentes, 88% já usaram ou ainda são viciados em drogas.

- A intenção é conhecer o perfil do menor e da sua família para podermos ajudá-lo - explica Matos.

Para representantes das ONGs e especialistas o problema do menor infrator começa nas ruas. Depois de 14 anos à frente da 1ª Vara da Infância e da Juventude, atualmente, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Siro Darlan, é enfático:

- Para reduzir a violência, não adianta aumentar efetivo policial. Tem que haver investimento no social. Faltam creches, escolas de primeiro grau, apoio à saúde, políticas para as famílias empobrecidas e o combate à drogadição - enumera Darlan lembrando que o ECA foi copiado por 14 nações ''A legislação é de qualidade só falta ser cumprida'' emenda.

O conselheiro tutelar estadual Distefano Santanna diz que o ECA representa progresso quando comparado ao antigo Código de Menores, de 1979. Segundo ele, antes os menores eram tratados apenas como delinqüentes ou abandonados. O secretário municipal de Desenvolvimento Social, Marcelo Garcia, diz apenas que ''não concorda com as denúncias de falta de política pública''. A defensora Simone de Souza, da Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, acrescenta que o ECA é mal interpretado.