Título: Para oficial, ainda há sobreviventes
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 24/07/2005, Rio, p. A27

Depois de seguir várias pistas durante as investigações da chacina de Acari, o coronel Valmir Alves Brum, oficial corregedor da Polícia Militar durante os governos de Leonel Brizola e Nilo Batista, acredita que ainda há sobreviventes. Para ele, alguns dos desaparecidos estão vivos e morando fora do Rio, provavelmente, no Estado de Minas Gerais. O coronel levanta a possibilidade de os policiais suspeitos de envolvimento no caso terem negociado a vida de pelo menos seis dos 11 desaparecidos. Segundo o coronel, em 1997, apareceram as primeiras evidências de sobreviventes. Na época, na região de Ribeirão das Neves, Pedro Leopoldo, o Josa, irmão de Moisés Santos Cruz, um dos desaparecidos, foi preso. No mesmo ano, descobriu-se que Édio do Nascimento, o Tijolo, filho de Laudicena (dona do sítio), poderia estar escondido em São Paulo e que ele teria trabalhado em Magé. Tijolo estaria envolvido em alguns crimes.

- Também descobrimos que alguns desaparecidos estavam regulares no Tribunal Regional Eleitoral. Os seus títulos não foram cancelados - acrescenta o coronel.

Segundo ele, os policiais do Rio teriam sido levados para o sítio por outros Pms e civis integrantes de grupos de extermínio.

- Depois de eliminar os que não tinham muito envolvimento criminoso, os policiais trocaram a vida de alguns jovens por dinheiro. Os seqüestrados teriam sido obrigados a desaparecer para não serem mortos - conta o coronel.

As primeiras pistas, segundo Brum, revelavam que os mortos tinham sido enterrados próximo ao cemitério de Bongaba, em Piabetá. Ainda de acordo com Brum, há dois anos, surgiram notícias de que os mortos teriam sido jogados do Viaduto do Grotão, no leito do rio, na descida da Estrada Petrópolis-Rio, atrás do Belvedere. Para o coronel, apesar do dado novo, não houve ''vontade política'' para retornar às apurações.

Segundo Brum, em 1991 foram identificados os policiais envolvidos na suposta extorsão aos jovens desaparecidos. No entanto, a ação penal contra os suspeitos foi paralisada pela interferência de um coronel PM, então deputado estadual.

- Foi um crime político que se apurado poderia ter evitado as chacinas da Candelária e Vigário Geral. Hoje, a saga de impunidade dos grupos de extermínios continua, mas, ao contrário de antes, as mortes são em prestações - avalia a consultora de Direitos Humanos, Cristina Leonardo.

Segundo a presidente do movimento Mães do Rio, Euristéia de Azevedo, desde 1990, 308 parentes de vítimas de violência policial se aliaram ao grupo.

- Nós somos enterrados com nosso filhos. Sofremos com a impunidade - diz Euristéia.

De acordo com o sociólogo Marcelo Freixo, da ONG Justiça Global, os casos de impunidade policial não são isolados:

- Acari se reproduz a cada instante. Para a população empobrecida a punição é rápida, elas são presas ou mortas.

O pesquisador Ignácio Cano, da Uerj, lembra que, no Rio, ocorrem entre 6 e 8 mil homicídios por ano e há apenas três delegacias de homicídios.

- Falta o poder público dar mais atenção para as delegacias e proteção às testemunhas - opina Cano.

Nos últimos cinco anos, a Corregedoria Geral de Polícias instaurou 77 processos administrativo-disciplinares.