Título: Lessa critica política de juros altos
Autor: Samantha Lima
Fonte: Jornal do Brasil, 27/10/2004, Economia, p. A19
Presidente do BNDES reclama de economistas que defendem o esvaziamento da instituição, em favor de bancos privados
Um dia depois de reclamar de economistas e segmentos do governo que acusam o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de ineficiência, o presidente da instituição, Carlos Lessa, redirecionou suas críticas à política de juros do país. Durante a abertura de Seminário sobre Arranjos Produtivos Locais, que termina hoje, Lessa classificou a taxa básica (Selic) de ''escandalosa''. - Eu pessoalmente acho os níveis da Selic muito altos - comentou. - Mas, se eu estivesse sentado em uma cadeira do Comitê Monetário Nacional, também estaria preocupado com a inflação. Só que precisamos entender que o melhor remédio para inflação é ampliar a produção.
Lessa disse, ainda, que as altas taxas levam as grandes empresas a quererem se tornar multinacionais, citando o caso da Ambev.
- As duas empresas que a formaram (Brahma e Antarctica), juntas, tomaram 700 empréstimos no BNDES nos últimos 40 anos. E, no fim das contas, preferiram se tornar belgas, enviando seus lucros para fora e criando empregos em outros países. Não critico, pois foi a opção que encontraram para ter acesso a taxas mais civilizadas no mercado externo - comentou.
O presidente do BNDES afirmou que as grandes empresas, nacionais ou estrangeiras, só vão querer investir no Brasil se o país voltar a crescer. E, por isso, defende que o banco se volte para as pequenas e médias empresas.
- O pequeno e médio produtor é formidável. É ele quem gera empregos no país. Por isso, estamos buscando formas de atender, com nossas linhas de financiamento, os Arranjos Produtivos Locais, aglomerações de pequenas empresas com a mesma atividade que atuam em cooperação. Essas empresas não vão querer se tornar belgas - comentou.
Um dos Arranjos Produtivos que montaram estande no hall do banco, vindo de Nova Serrana, no centro-oeste de Minas Gerais, foi alvo de elogios de Lessa. A cidade, com 40 mil habitantes, tem cerca de 90% de sua população economicamente ativa empregada em atividades ligadas à produção de calçados esportivos, segundo dados do comitê composto por empresários, funcionários e autoridades locais. São 1.100 empresas que produzem 300 mil pares por ano, 95% destinados ao mercado interno. Uma das aspirações do aglomerado é obter financiamento para criação de um centro de design que atenda todos os produtores.
- Essa APL é um exemplo por sua capacidade de geração de emprego e produção. Quero vê-la competindo em condições de igualdade com a Nike - afirmou.
Lessa voltou a rebater críticas de economistas que sugeriram a disponibilização dos créditos concedidos com o Fundo de Amparo ao Trabalhador, que compõem a base de recursos do BNDES, diretamente pelos bancos comerciais. Ainda recuperando-se de uma cirurgia no joelho, realizada há três semanas após uma queda, desta vez Lessa citou nominalmente Edmar Bacha, Persio Arida e André Lara Resende, ex-presidentes do banco.
- Duas coisas têm me irritado. Primeiro é essa perna que não posso dobrar. Segundo são esses agentes supostamente bem pagos para destruir o BNDES - reclamou. - Países como a Argentina, que seguiram as sugestões dessa turma, não foram a lugar algum. O BNDES terá lucro recorde este ano, e isso não é mérito meu, mas demérito de administrações passadas, que classificaram erradamente como perdidas operações que, hoje, estamos conseguindo cobrar.