Título: China muda câmbio para americano ver
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 22/07/2005, Economia & Negócios, p. A19

As repetidas cobranças da comunidade internacional para que a China permitisse a valorização de sua moeda tiveram a primeira resposta ontem. O governo do país asiático decidiu atrelar a cotação do yuan a uma cesta de moedas, e não apenas ao dólar. Na prática, a divisa americana vale hoje 8,11 yuans, o que representa uma valorização de 2,1%. O Banco Popular da China determinou ainda uma banda de variação de 0,3% para mais ou para menos. Nos últimos 10 anos, a cotação oficial foi atrelada somente ao dólar e, desde 1998, US$ 1 flutuava entre 8,276 e 8,280 yuans.

Mas a decisão, apesar de elogiada, não chega a ser um alento para aqueles que competem contra a enxurrada de produtos made in China nos mercados internacionais. Estados Unidos e União Européia afirmaram diversas vezes que a desvalorização excessiva do yuan chegava a 20%, aumentando artificialmente a competitividade das exportações chinesas.

Por isso mesmo, analistas não acreditam que a valorização de 2,1% vá significar um ganho palpável para os concorrentes, mesmo para os Estados Unidos, que têm um desequilíbrio anual de US$ 150 bilhões no comércio com a China. De qualquer forma, a Casa Branca elogiou ontem a decisão do governo chinês.

O Brasil, apesar de ver, ano a ano, as importações de produtos chineses dispararem, também não deve ser exceção.

- Para que o Brasil tenha ganhos reais na corrente de comércio, outras decisões como essa têm que ser tomadas num curto espaço de tempo. Os produtos brasileiros só serão beneficiados de fato se a valorização chegar a 7%, 8% - diz Carlos Urso, economista da LCA Consultores.

Segundo a analista de mercados internacionais Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria, o efeito marginal de um possível aumento das exportações brasileiras - diante da expectativa de que a China passe a importar mais - seria neutralizado pelo reforço à tendência de valorização do real.

- Deixando de compor as reservas exclusivamente com o dólar, os chineses comprarão menos a moeda americana, o que aumentará sua liquidez no mercado internacional. Assim, a tendência é de que o real valorize ainda mais, acentuando as reclamações dos exportadores - alerta.

Alessandra ressalta ainda que a valorização do yuan não aconteceu apenas por pressão da comunidade internacional.

- A economia chinesa vem crescendo em um ritmo muito intenso mas ainda se depara com alguns gargalos logísticos e risco de inflação. A valorização freia um pouco esse crescimento - diz ela, lembrando que o PIB do país cresce acima de 9% há oito trimestres seguidos.

- Não podemos achar que a China simplesmente fez o que o Ocidente pediu. O governo adequou o câmbio à situação atual - reforça a professora Maria Lúcia Pádua Lima, coordenadora do Centro de Estudos Internacionais da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP).

Mas a professora da FGV-SP não acredita que o governo chinês - ''centralista e autoritário'' - vá apoiar a valorização constante.

- Há uma preocupação grande em relação à valorização rápida do yuan, que pode causar o colapso do frágil sistema financeiro chinês. O governo continuará cauteloso, apesar da pressão internacional - prevê Maria Lúcia.

A Malásia seguiu a China e afrouxou o câmbio. A mudança anunciada pelo BC chinês causou ainda valorização recorde do iene.