Título: Dia importante para Dirceu e o Brasil
Autor: Eduardo Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 31/07/2005, Outras Opiniões, p. A11

Filho de Castorino de Oliveira e Silva e de Olga Guedes da Silva, José Dirceu de Oliveira e Silva nasceu em 16 de março de 1946, em Passa Quatro, Minas Gerais. Desde então a história do Brasil tem tido muito a ver com a de José Dirceu. Aos 23 anos, quando era presidente da União Estadual dos Estudantes, foi preso pelas forças de repressão do regime militar junto com centenas de companheiros. Eles est avam reunidos em Ibiúna para o 30° Congresso da União Nacional dos Estudantes. Ali discutiam meios de assegurar liberdade, fraternidade, igualdade de direitos e democracia para todos os brasileiros e povos do mundo. Por sua brava luta contra a ditadura teve a nacionalidade cassada e foi banido do país. No exílio trabalhou e estudou em Cuba, retornou ao Brasil clandestinamente e reassumiu sua liderança política com a anistia de 1979. Engajou-se imediatamente no Movimento Pró-Fundação do Partido dos Trabalhadores. Formou-se em Direito e fez pós-graduação em Economia na PUC-SP.

Aproximei-me de José Dirceu desde a fundação do PT, em 10 de fevereiro de 1980, junto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Sérgio Buarque de Hollanda, Mário Pedrosa, Paulo Freire e tantos outros. Dirceu exerceu funções-chave no PT, como a de secretário de Formação Política de 1981 a 1983, secretário geral do Diretório Regional de São Paulo de 1983 a 1987, secretário geral do Diretório Nacional de 1987 a 1993, presidente do PT de 1995 a 2002, deputado estadual de 1987 a 1991 e deputado federal de 1991 até hoje.

Foi também o principal coordenador das campanhas presidenciais do PT desde 1989 até a vitória de 2002, quando Lula foi eleito no segundo turno com 53 milhões de votos, 62% de todo o eleitorado. Demonstrou grande experiência organizadora, sobretudo nas duas grandes campanhas cívicas nacionais.

A primeira, a Diretas-Já, em 1983 e 1984. Em novembro de 1983, organizou o primeiro grande comício, diante do Estádio Municipal do Pacaembu, em São Paulo. Vieram outros - das maiores manifestações de nossa história -, culminando com os grandes comícios do Anhangabaú, em São Paulo, e da Candelária, no Rio de Janeiro. Ao lado de Sobral Pinto, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola, Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso, Miguel Arraes, entre outros, Lula foi dos oradores mais importantes. José Dirceu estava ao seu lado.

A segunda começou quando José Dirceu e eu ouvimos, por cinco horas, no Hotel Maksoud, em São Paulo, o relato de Pedro Collor de Mello, irmão do então presidente, sobre Paulo César Farias. Ficamos impressionados. Fomos até minha casa e juntos escrevemos o requerimento para a instalação da CPI que resultou na queda do presidente Fernando Collor de Mello. Por todo o país desencadeou-se a extraordinária campanha por Ética na Política. Mais uma vez José Dirceu à frente. Como os jovens ''cara-pintada'' nas ruas, nos discursos do plenário da Câmara dos Deputados marcava a vida política do país.

Quando o PT me indicou como candidato a deputado federal em 1982, a prefeito, em 1985 e 1992, a governador em 1986, a vereador em 1988, e ao Senado em 1990 e 1998, e em suas candidaturas a deputado estadual, federal e a governador, em 1994, interagimos bastante. Havia desavenças, é claro, mas sempre soubemos superá-las.

Em anos recentes dei certo trabalho ao companheiro José Dirceu. Pois resolvi ser pré-candidato à Presidência, em 2002, versus nossa liderança maior, Lula, que em 17 de março daquele ano teve 84,4% dos votos, eu ficando com 15,6%, com o comparecimento de 172 mil filiados em todo o Brasil. Pela primeira vez na história do país um partido político convocou todos os filiados para a escolha do candidato à Presidência. Presidente do PT, José Dirceu, ainda que tivesse Lula como candidato, soube organizar a prévia e presidi-la com imparcialidade. Tenho a convicção de que resultou em maior legitimidade ao nosso candidato. Desde a sua vitória, naquela data, percorri o país apoiando-o com toda a energia.

Em 2003 tivemos algumas diferenças. Defendi que não fossem expulsos os parlamentares que discordavam da reforma da Previdência, pois acreditava que se tratava de questão de consciência, prevista no estatuto do PT. Em 2004, quando ocorreu o episódio Valdomiro Diniz, sugeri que Dirceu comparecesse ao Senado para responder às perguntas dos parlamentares. Dirceu não aceitou. Posteriormente, em duas ocasiões, reconheceu que talvez devesse ter seguido a minha sugestão.

Agora surgiu esse turbilhão de denúncias envolvendo o governo e o PT. O depoimento do deputado Roberto Jefferson ao Conselho de Ética e à CPI dos Correios foi importante. Mais importante, entretanto, para a nossa história, será o de José Dirceu.

Tenho certeza de que Dirceu prestará um enorme serviço ao presidente Lula, ao PT e à nação ao transmitir ao Congresso nacional a verdade completa sobre os fatos. Sejam eles referentes ao que ocorreu quando outros partidos estavam no poder, mas também e sobretudo ao período em que foi ministro-chefe da Casa Civil. Mesmo que resulte em conseqüências difíceis para todos nós. Juntos, saberemos superá-las. Creio que é isso que o país espera dele.