Título: Palavra contra palavra
Autor: Karla Correia e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 03/08/2005, País, p. A2

Os dois principais adversários políticos do momento duelaram ontem, olhos nos olhos, no Conselho de Ética da Câmara. Convocado como testemunha, o deputado José Dirceu (PT-SP) rebateu todas as acusações do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Num depoimento que durou dez horas, negou que tivesse conhecimento dos empréstimos avalizados por Marcos Valério ao PT, responsabilizando a direção do partido. Também rechaçou que fosse o responsável pelo esquema de corrupção que assombra o governo e que tenha articulado a criação do mensalão. Citando sua biografia, afirmou ainda que jamais pensou em renunciar ao mandato. ¿ O Brasil conhece a minha vida. Não teria condições de andar de cabeça erguida, de olhar nos olhos da militância do PT, da minha geração de 68, dos que morreram lutando contra a ditadura, se renunciasse ao mandato. Vou lutar até o fim ¿ cravou Dirceu.

Na primeira fila, à direita de Dirceu, Jefferson manteve todas as denúncias ¿ sem apresentar provas ¿ e acrescentou outra: uma suposta negociação ilegal entre PT e PTB com a Portugal Telecom para acertar as contas entre os dois partidos. Emissários das legendas teriam ido a Portugal. Jefferson não esclareceu se chegou a ser feito algum acerto com a empresa portuguesa, dona de 50 por cento do maior grupo de telefonia móvel do Brasil, a Vivo. Dirceu rechaçou.

Dirceu disse não aceitar pré-julgamento nem tentativas de transformá-lo em um chefe de quadrilha.

¿ Não organizei, não sou chefe, jamais permitiria a compra de votos e o pagamento de parlamentares. Não é verdade que eu seja o responsável pelo Mensalão. Se há uma CPI, eu quero depor.

O ex-ministro afirmou que as reuniões mantidas com parlamentares de partidos aliados na Casa Civil faziam parte das articulações políticas que estavam sob sua responsabilidade, especialmente no primeiro ano de governo Lula. Negou que o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira tivesse uma sala no quarto andar do Planalto. Confirmou que Silvio Pereira, como representante do PT, participava de reuniões com outros partidos aliados, para definir a divisão de cargos dentro de um governo de coalização.

¿ A diferença dele, em relação aos demais participantes dos acordos, é que o Silvio não tinha mandato parlamentar, como os demais ¿ acrescentou.

Sobre Marcos Valério Fernandes de Souza, Dirceu afirmou conhecê-lo, mas sem ter qualquer tipo de relação de amizade. Apesar das declarações de Valério à Procuradoria-Geral da República e de Renilda Santiago na CPI dos Correios, Dirceu negou que tivesse qualquer conhecimento sobre os empréstimos firmados pelo PT junto aos bancos BMG e Rural.

¿ Sou responsável pelos meus atos frente à Casa Civil. Não assumo os atos da direção do PT, porque não era membro do diretório nacional.

Dirceu negou que tenha deixado o governo após o ultimato dado pelo presidente do PTB: ¿Sai daí, Zé, sai rápido, para não fazer réu um homem inocente¿.

¿ A decisão foi tomada dois dias antes do depoimento de Vossa Excelência no Conselho de Ética da Câmara. Foi uma decisão do presidente Lula.