Título: Depoimento orquestrado
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 04/08/2005, País, p. A5

Maior sacadora das contas do publicitário Marcos Valério de Souza, a diretora financeira da SMPB, Simone Vasconcelos, economizou palavras e sustentou a versão de que os recursos financeiros que ela movimentou foram empréstimos tomados pelas empresas de Valério e repassados ao PT. Simone disse que todos os saques eram contabilizados como empréstimos ao partido.

Apesar de parlamentares de diversos partidos estarem entre os destinatários desses recursos, ela disse não ter conhecimento de que esses pagamentos eram referentes ao mensalão.

A diretora financeira afirmou ainda que o ex-secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, sabia dos saques repassados a políticos e que o dinheiro seria utilizado para pagar dívidas de campanha.

Simone Vasconcelos fez questão de repetir que obedecia somente às ordens de Marcos Valério e utilizou esse argumento para se esquivar de perguntas feitas pelos integrantes da CPI, que buscavam detalhes sobre o esquema montado entre o sócio da SMPB e o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares.

Os parlamentares ficaram irritados com o desconhecimento alegado por Simone sobre as operações financeiras da empresa em que trabalhava, mesmo tratando-se de funções inerentes ao seu cargo. Ela teve dificuldades para informar até os principais clientes da SMPB.

- Essa situação é nova para mim, me dá branco - respondeu ao deputado Carlos Abicalil (PT-MT).

O depoimento de Simone foi considerado como uma ''orquestração'' por Gustavo Fruet (PSDB-PR) que afirmou que ela e Valério estão em sintonia nas respostas e não dizem nada que a imprensa não tenha publicado. A diretora financeira mostrou-se segura e chegou a ser considerada ''arrogante'' pelos parlamentares.

- Não tenho memória para números. Não me perguntem sobre números. Diretora financeira não tem obrigação de saber números de cabeça, me desculpem - argumentou causando irritação entre alguns integrantes da CPI.

Responsável pelas finanças da SMPB, Simone tentou subestimar sua atuação no esquema, mas disse não se arrepende de nada .

- Não me arrependo porque sou muito grata ao Marcos Valério, que me deu oportunidade de crescimento profissional.

A versão de Simone, de que os recursos que abasteciam o caixa dois de políticos eram provenientes somente de empréstimos tomados no Banco Rural e no BMG, não convenceu parlamentares da oposição.

Ela afirmou que se encontrou com Delúbio apenas uma vez, quando foi com Valério à sede do PT em São Paulo. Simone Vasconcelos teria ficado na copa enquanto o publicitário se reuniu com o ex-tesoureiro.

A diretora financeira da SMPB e seu advogado, Marcelo Leonardo, tentaram fazer o depoimento a portas fechadas, mas o pedido foi negado. Ela prestou o depoimento na condição de testemunha e assinou um termo em que se comprometia em dizer a verdade.

Simone e Marcos Valério apresentaram à Procuradoria Geral da República, nesta semana, duas listas de beneficiários do dinheiro, uma com 31 nomes e outra, de 12 nomes que foi alterada. O ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), teria sacado R$ 50 mil, e não R$ 200 mil, como constava na lista anterior. A correção foi feita pelo próprio Valério em depoimento à Procuradoria na terça-feira e anunciada ontem pelo relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR).