Título: ''Opportunity queria resolver tensão com o PT''
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 06/08/2005, País, p. A4
Vice-presidente da CPI do Mensalão, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) ganhou minutos de notoriedade nacional esta semana depois de enquadrar pela primeira vez o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). O parlamentar gaúcho repreendeu o deputado fluminense, alertando que Jefferson não tinha autoridade para rasgar documento encaminhado à CPI e relacionou o mensalão também ao PTB. Agora, Pimenta quer colocar no banco dos réus da CPI o banqueiro Daniel Dantas, dono do Grupo Opportunity, que controla empresas de telefonia que mais fizeram depósitos nas contas de Marcos Valério Fernandes de Souza, acusado de ser operador do mensalão. Apesar da crise no Planalto, Pimenta acredita que ainda há tempo para o presidente Lula reverter o jogo. ¿ Ele tem de fazer essa faxina ¿ avalia.
A convocação do Daniel Dantas para a CPI dos Correios é importante? ¿ Ao que tudo indica ele é o maior depositante de recursos nas empresas do Marcos Valério. São recursos de valores muito superiores a eventuais contratos que ele poderia ter com Marcos Valério. Estamos diante de um episódio que há muitos anos o Marcos Valério atua como o lobista de interesses privados. Nada mais adequado que aquele que pode ser o maior financiador deste esquema vir a público dizer qual é a sua participação neste processo.
O Marcos Valério representaria outros interesses também? ¿ Com certeza. Ele é um lobista de interesses privados. Pelo menos desde 1998, já está devidamente comprovado. O primeiro episódio foi a eleição do Eduardo Azeredo (PSDB) em Minas, que está suficientemente comprovado. O prédio onde fica a agência do Marcos Valério pertencia ao Ricardo Sérgio. Isto mostra a intimidade que ele tinha desde o início do governo tucano. Em um processo muito bem articulado, quando ele percebeu que o Lula tinha chance de ganhar, ele movimentou parte de seus interesses nessa direção. Porque resolvermos chamar o Cristiano Paz? Ele assina todos os cheques, assina todos os contratos junto. Todas as informações levam a crer que o Marcos Valério assumiu o papel de buscar a aproximação com o PT e com os governos do PT. E o Cristiano Paz fazia o outro lado.
Com o PSDB? ¿ PSDB e PFL. Foi pensando nos interesses privados que eles representam.
O Dantas pode ser a ponte do mensalão do PSDB para o PT também? ¿ Com certeza, ele pode. O Marcos Valério já disse que buscou reuniões onde representantes do Banco Opportunity queriam resolver o nível de tensão que tinham nas relações com o PT. Ele não fez isso inocentemente, foi uma coisa consciente, foi uma coisa pensada. E esse episódio da Portugal Telecom é muito ilustrativo do papel e da fórmula pela qual se movimenta o senhor Daniel Dantas, tendo o Marcos Valério talvez como um dos operadores de seus interesses no mercado brasileiro.
É muito dinheiro envolvido. Não havia um banqueiro, um corruptor? ¿ O Marcos Valério não tem estatura comercial, não tem nível de contratos que justifiquem o volume de recursos que circularam por dentro de suas empresas. Obrigatoriamente, por trás desta história tem os grandes financiadores, que podem ser chamados também de corruptores. São contratos com a Assembléia Legislativa de Minas, com o governo do Distrito Federal, com a Assembléia Legislativa do Distrito Federal, com prefeituras, com empresas estatais.
Daniel Dantas, com o poder financeiro que tem, não conseguiria abafar o requerimento para ir à CPI? ¿ Se nós conseguirmos que a própria imprensa possa iluminar, amplificar as informações, será incontornável a necessidade de se chegar até o senhor Daniel Dantas. Não haveria uma justificativa lógica, razoável, que permitisse explicar porque você ouve um Davi, policial de Minas Gerais, mula, carregador de malas, e não ouve o maior depositador de recursos nas contas de Marcos Valério, sem justificativa de origem deste dinheiro. É uma coisa que qualquer pessoa de bom senso não conseguiria entender.
O Roberto Jefferson, que admitiu ter pego dinheiro, não foi poupado pelo Congresso? ¿ É o réu confesso. Confessa que nos últimos anos, em todas as campanhas que participou, operou com caixa 2. Que recebia dinheiro do PSDB, no esquema dos tucanos, durante o governo do Fernando Henrique Cardoso, para as campanhas do PTB no Rio de Janeiro. É acusado de envolvimento em esquema de irregularidade em Furnas, nos Correios, na Polícia Rodoviária Federal, no INSS, no IRB, e é tratado como alguém que deva servir como exemplo de coragem, de conduta ética, de compromisso com a verdade.
Por que o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, quer fechar um acordo para não cassar ninguém? ¿ Acredito que existe um conjunto de interesses que há muito anos acompanham na sombra a vida política nacional, que disputam os instrumentos reais de poder do país, no sistema financeiro, as telecomunicações, no setor elétrico, que manipulam muitas vezes sem aparecer, até mesmo com financiamento de campanhas, o processo democrático brasileiro. Realmente estão preocupados que este processo fuja do controle e chegue neles.
De que forma as denúncias atingem PFL, PSDB, PP, PL e PTB? ¿ Enquanto se fala de mensalão é interessante para eles, pois desqualifica a política e torna mais frágeis os partidos diante da possibilidade de manipulação.
Qual a saída para os partidos políticos? ¿ A partir do momento que resolvermos levar o negócio até às últimas consequências e fazer aparecer quem são os corruptores, começa já a mudar o tom. Acho que o PT só tem uma saída. Levar este processo até às últimas consequências.
Seria ir a fundo na vida política brasileira e nos partidos? ¿ O erro principal que cometemos foi não fazer isso quando nós assumimos. Naquele processo de transição, o Fernando Henrique pedindo ao Lula que tivesse `um papel de estadista, de olhar para frente, de esquecer o passado¿. Nós tínhamos que ter assumido e ter feito uma faxina. Tudo que está aí aparecendo agora, nada é novo. O cara das Furnas, faz 16 anos que está lá. O Roberto Jefferson há 10 anos manda nos Correios, o Marcos Valério vem desde 1998. Não tem nada de novo. O que aconteceu é que alguns deram uma turbinada no esquema do Marcos Valério. O erro foi ter assumido com receio de que fosse feita uma leitura, um processo de perseguição, de caça às bruxas.
Se o PT não fizer essa faxina, afunda com todo mundo? ¿ Afunda com todo mundo. Depois foi `garantir a governabilidade, não mexer em pessoas estratégicas, que têm a memória¿. Destas figuras que estão vindo aí, não há nada de novidade. Tudo é carta carimbada, conhecida da política nacional.
O senhor acredita que o presidente Lula ainda dê a volta por cima até o fim do governo, em 2006? ¿ Acredito que sim. Para isso, ele tem que fazer essa faxina.