Título: Dia dos Pais esbarra na distância dos filhos
Autor: Bruno Rosa
Fonte: Jornal do Brasil, 06/08/2005, Economia & Negócios, p. A17
A uma semana do Dia dos Pais, poucos varejistas contam com a data para impulsonar suas vendas. De terceira melhor data para o setor, responsável por até 20% das receitas anuais, há uma década, o segundo domingo de agosto amarga hoje a sétima colação, representando só 8% dos negócios. É o que revela pesquisa exclusiva feita para o Jornal do Brasil pelo especialista Ulysses Reis, da Treinasse Consultoria e professor do MBA de Varejo da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Por trás das vendas menores, está a mudança no estilo de vida da sociedade brasileira. Nas famílias, que cada vez mais são tocadas pelas mulheres, a figura masculina perdeu peso. Por isso entenda-se: o aumento do número das mães solteiras nos últimos 30 anos. De 1970 para 2000, de acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas passaram de 2,73% das mulheres para 16,37%.
¿ Qualquer data comemorativa no varejo é criada em relação ao comportamento social. Por isso, os pais vêm perdendo importância nas vendas. As famílias estão cada vez mais desestruturadas, com mulheres cuidando sozinhas dos filhos, por exemplo ¿ diz Reis.
Entre os comportamentos que se traduzem em vendas especiais no varejo, o Dia dos Pais, segundo Ulysses, aparece atrás do Natal, Dia dos Namorados, Mães, volta às aulas, férias escolares e festas juninas, além do Dia das Crianças. Há dez anos, perdia apenas para as mamães e as festas de fim de ano.
¿ As lojas fazem apenas ações focadas no varejo. Nem os lojistas acreditam muito na data. Ninguém espera boas vendas. A maioria das empresas nem investe em campanhas publicitárias, com exceção das grandes lojas de departamento. No Nordeste, o faturamento é maior com as festas juninas e, no Sudeste, com as férias escolares ¿ afirma Reis.
Para se ter uma idéia do enfraquecimento da data, de acordo com dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) da Câmera de Diretores Lojistas (CDL), as consultas no Dia dos Pais foram, em volume, 60% menores que no Dia das Mães no ano passado.
¿ A quantidade de compras vem perdendo representatividade ao longo dos anos. A distância do volume de consultas entre as vendas dos pais e das mães aumenta a cada ano. Em 2003, era de 45% ¿ exemplifica Ubaldo Pompeu, superintendente da CDL-Rio.
Como na maioria dos casos de separação os filhos acabam indo viver com as mães, os pais ficam mais distantes das crianças e da mulher. Assim, as compras de presentes também perdem significado.
¿ Quando se passa muito tempo longe do pai, é difícil acertar no presente. Por isso, muitos filhos, sem a ajuda da mãe, optam por lembranças de baixo valor que não despertam muito interesse paterno, o que derruba o faturamento do comércio com a data ¿ aponta Reis, da FGV, lembrando que são as mulheres que movem o varejo. Segundo o Índice Nacional dos Shoppings, as compras femininas representam até 80% do faturamento no comércio.
O comerciante Júlio Fernandes, de 40 anos, está separado há nove. Acabou perdendo contato com as duas filhas, Joana e Gabriela.
¿ É muito ruim porque você acaba ficando ausente do dia-a-dia. Elas se mudaram para São Paulo e quase não as vejo. No Dia dos Pais, é claro, apenas um telefonema. Elas nem sabem do que gosto e eu também não sei das preferências delas. É algo que só se sabe convivendo ¿ disse Julio, enquanto passeava no Shopping Tijuca.
Não são apenas as lembranças que derrubam o faturamento de agosto. Segundo Antônio Cesar Carvalho de Oliveira, da Acomp Consultoria, o homem gosta de ganhar presentes que tenham alguma utilidade. E, com a mudança de hábitos sociais, lenços, isqueiros, abotoaduras de manga e prendedores de gravata, que são objetos baratos, não são mais usados.
¿ As mulheres têm mais opção de presentes com preços mais variados, diferente dos homens ¿ cita Antônio.
Prova de que a instituição do casamento não atravessa boa fase, o Dia dos Namorados este ano experimentou vendas maiores do que as do Dia das Mães. Para Reis, as comemorações dos namorados são feitas em três fases: a pré (quando as mulheres vão ao salão, por exemplo), a compra do presente e a pós (como viagem, restaurantes e hotéis). Divisão que impulsiona o faturamento da data no comércio.