Título: Reforma política, um velho antídoto para todas as crises
Autor: Ana Carolina Gitahy, Bruno Arruda, Paula Barcelos
Fonte: Jornal do Brasil, 07/08/2005, País, p. A2

Podem estar próximos do fim os 12 anos de banho-maria em que a noção de reforma política tem sido cozinhada no Congresso Nacional. Em cada crise, a reforma é levantada como antídoto para todas as mazelas. A atual, desencadeada pelo deputado Roberto Jefferson, envolve cifras milionárias, que através de Marcos Valério, passaram pelas mãos de parlamentares, de homens influentes no PT, derrubou ministros, como o deputado José Dirceu. Desta vez, tanto nas ruas, bares, escolas e locais de trabalho quanto entre os parlamentares, cresce a percepção de que mudanças profundas no sistema político-partidário brasileiro deixaram de ser apenas aconselháveis e passaram a indispensáveis para a sustentação daquilo que sobrar quando a avalanche de escândalos cessar. As menções à reforma política, na maioria das vezes, se referem ao Projeto de Lei 2.679, sob relatoria do deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO), que passou pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 22 de junho e está pronto para ser votado. Conforme Caiado, foi decidido em reunião entre lideranças e presidentes de partidos, durante café da manhã na casa do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, que o projeto entraria na pauta em agosto. Por envolver modificações no processo eleitoral, precisaria ser aprovado até setembro para passar a valer já para as próximas eleições.

Conforme o relator, a guia-mestra da proposta é atacar o que considera serem os dois maiores problemas no sistema atual: o financiamento de campanhas e o troca-troca de partidos pelos parlamentares. Como soluções, propõe o financiamento público das campanhas e as listas fechadas, em que os eleitores escolhem as legendas e assumem as cadeiras os deputados na ordem definida pelos próprios partidos.

Não será fácil, no entanto, aprovar o projeto com a velocidade desejada pelo relator. Para o deputado Miro Teixeira (PT-RJ), o projeto constitui, na verdade, uma anti-reforma. Miro aponta com desgosto especial para uma das disposições na lei, que reduz para 2% a cláusula de barreira. Trata-se de um dispositivo que limita o direito ao Fundo Partidário - atualmente pago pelo governo aos partidos - e o direito a horário eleitoral gratuito nas emissoras de rádio e TV aos partidos que tiverem um mínimo percentual de representantes eleitos.

Nas próximas eleições deve entrar em vigor o limite de 5% - definido há quase uma década e considerado ideal pelo deputado petista. Na prática, exigir que os partidos tenham muitos representantes eleitos para que recebam os benefícios constitucionais deve reduzir o número de partidos existentes e atuantes a cinco ou seis, após as eleições. Para Miro, diminuir o percentual de representação para 2% é retroceder, ao permitir a sustentação dos chamados partidos de aluguel - legendas sem posição ideológica claramente definida, com pouca representatividade, que trocam os benefícios a que têm direito, como o tempo na TV, por outras vantagens. O senador Jefferson Peres (PDT-AM) concorda com a proposta.

- E estou à vontade para defender isso, já que meu partido possivelmente ficaria de fora - acrescentou o senador.

Miro Teixeira acredita que o ideal seria manter parte do sistema eleitoral como está, por hora, com a diferença da cláusula de barreira de 5%. Para ele, o importante é limpar os financiamentos das campanhas ao explicitar as contribuições e reduzir o caixa 2, já que a corrupção não é um mal do sistema eleitoral, mas da forma como ele é praticado.

- O roubo não tem nada a ver com eleições. Essa lógica transformaria ditaduras nos regimes mais puros quando são os mais corruptos. Não confundo qualquer prática de apropriação do dinheiro público com o processo eleitoral.

O senador Pedro Simon (PMDB-RS) discorda. Ele é autor de projeto que insiste no financiamento público de campanha e acredita que esta é a melhor forma de combater esse aspecto da corrupção.

- Meus 40 anos de vida pública me levaram a ver que toda a corrupção nasce da campanha. O financiamento precisa ser público e as contribuições privadas, proibidas - defendeu Simon.

Para Jefferson Peres, o financiamento público é uma boa idéia em teoria, mas poderia adquirir um outro contorno ao ser aplicada. De acordo com o senador, na prática, a mudança não inibiria a corrupção, apenas a transformaria. O essencial é apertar a fiscalização sobre os gastos em campanhas.

Bem menos polêmica é a necessidade de afastar as campanhas da publicidade. O senador Pedro Simon e Miro Teixeira apontaram a necessidade de estimular os debates ao vivo e programas de entrevistas: a exposição das idéias do candidato em vez dos efeitos especiais dos marqueteiros. (B.A)