Título: Punição ainda é o remédio
Autor: Ana Carolina Gitahy, Bruno Arruda, Paula Barcelos
Fonte: Jornal do Brasil, 07/08/2005, País, p. A2

A busca por alternativas para sair de uma crise que começou como mais um caso de corrupção em estatal e se transformou, possivelmente, no maior escândalo da história do Congresso, podendo envolver mais de uma centena de deputados, gerou nos movimentos sociais o apelo por uma rígida apuração. Nascidos em meio às adversidades enfrentadas pelas camadas mais pobres da população, organizações como a Pastoral da Criança e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra criticam os efeitos que a crise provoca na sociedade. A saída, para ambos, está na completa apuração dos fatos.

- É bastante doloroso porque foram os mais pobres que fizeram Lula chegar ao poder. Por isso acredito que a impunibilidade será muito pior. Deve haver uma análise muito séria e a punição aos culpados - defende a coordenadora da Pastoral da Criança, Zilda Arns.

A perversidade do sistema econômico vigente é o vilão apresentado pelo Coordenador do MST, João Pedro Stédile.

- A crise é grave, porque tem na sua base a manutenção de uma política econômica neoliberal, que não resolveu os problemas sociais, ao contrário os agravou. É uma crise política da representação no parlamento e uma crise ideológica das esquerdas, que demonstraram usar os mesmos métodos de campanha política da direita. É preciso começar debatendo com a sociedade a construção de novo modelo econômico, anti-neoliberal - analisa.

A proposta de convocação de uma Assembléia Constituinte gera controvérsias. Para Zilda Arns, a proposta é boa, mas o conturbado momento político do país atrapalha:

- Acredito que tomar grandes decisões em momentos de crise não é conveniente. Entra muita paixão e isso afetará as decisões. Devemos esperar passar a crise para pensarmos melhor. Porque a corrupção já é quase parte da cultura brasileira. A mudança na Constituição deve ser feita para criar formas de torná-la mais difícil.

João Pedro Stédile defende a reforma da Carta a partir do fortalecimento dos mecanismos de democracia direta, com a difusão de plebiscitos.

- É preciso debater uma reforma política de fundo, que construa mecanismos de democracia direta, do direito ao plebiscito, concordados pelo povo, dando a ele o poder de revogar mandatos. Essas mesmas forças mudaram 54 vezes a Constituição desde 1995, e em nenhum caso avisaram ao povo, muito menos consultaram-no. Só sairemos dessa crise se a sociedade se mobilizar, e reacender o movimento de massas - conclama.

As massas são justamente os mais afetados pela crise. A coordenadora da Pastoral da Criança verifica isso no dia-a-dia:

- É muito dinheiro e poderia salvar a vida de muitas crianças, criar milhares de escolas e capacitar o sistema público de ensino. As pessoas estão chateadas, porque para eles o 'ser' é mais importante do que o 'ter'. Nesses 22 anos de Pastoral vejo a partilha que os líderes pobres fazem nas comunidades. São relações de mútua ajuda muito fortes. Eles prestam conta de cada R$ 10 que recebem, para eles, ver aqueles milhões desviados é um choque muito grande. (P.C.P.)