Título: Charuto brasileiro ganha paladar mundial
Autor: Bruno Rosa
Fonte: Jornal do Brasil, 07/08/2005, Economia & Negócios, p. A20

Num universo dominado pelos cubanos, o charuto brasileiro tem alcançado posição de destaque no mercado internacional. Os produtos feitos na Bahia também já conquistaram o paladar dos brasileiros e ultrapassaram, no ano passado, pela primeira vez, a venda dos famosos rolos de fumo da ilha caribenha. Em plena combustão, o negócio movimenta cerca de US$ 17 milhões por ano, de acordo com o Sindicato do Fumo da Bahia. Os responsáveis pelo sucesso são o clima e o solo da Bahia, único estado brasileiro com produção suficiente, e dentro dos padrões internacionais, para garantir os embarques. O estado abriga todas as dez fábricas do setor que, juntas, produzem cerca de 10 milhões de unidades por ano.

De acordo com a PromoBahia (Centro Internacional de Negócios da Bahia), as exportações movimentaram em 2004 US$ 335,5 milhões, alta de 15% em relação ao ano anterior. O volume embarcado chegou a quase 10 toneladas.

¿ No primeiro semestre deste ano, as exportações já chegam a US$ 252 milhões. A alta em relação ao mesmo período do ano passado é de 82%, com um volume embarcado que chega a quase 6 toneladas ¿ acrescenta Arthur Souza Cruz, presidente da PromoBahia.

Resultado: com exceção do produto cubano, o fumo baiano está presente em 60% dos charutos no mundo. São exportados 95% da produção nacional. O principal destino são bares e tabacarias americanas, européias e canadenses.

Mas o que está por trás do sucesso charuto brasileiro? Para as empresas que fabricam, a resposta é simples. Trata-se do fumo claro (ou capa clara, como é classificada pelas empresas), diferente dos cubanos e dominicanos, com sabor mais suave. No Brasil, o produto é originado de plantas como mata fina, mata norte e Bahia/Sumatra.

Se depender de Marcelo Sande, da R&S Tabacos do Brasil, o setor continuará em ascensão. O empresário, há apenas quatro meses no mercado, investiu R$ 500 mil depois de três anos de pesquisas no lançamento de três versões: clássico, maduro e aromatizado. O detalhe fica por conta do tubo de ensaio com tampa de plástico, que conserva melhor o produto. Os charutos da empresa estão presentes em mais de 12 pontos de venda no Rio e em cidades como Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, São Paulo e Brasília.

¿ Sou o único fabricante nacional que tem vidro protegendo o charuto. Foram três anos de muito estudo. Eu criei o sabor, desenvolvi a caixa e o slogan da empresa. Queria dar uma tropicalidade ao produto, por isso criei versões mais suaves e encorpadas ¿ diz Sande, que decidiu montar seu próprio negócio depois de conhecer o lucrativo mercado vendendo produtos importados de Cuba.

Porém, ao mesmo tempo em que os negócios andam de vento em popa (a empresa já prepara o lançamento de uma quarta versão, de fumo mais forte), Sande reclama da falta de estrutura industrial no Rio.

¿ O governo acha que o estado inteiro é um balneário. Não há investimentos na indústria local. Sou carioca e a sede da empresa é aqui. Mas a tampa e o adesivo com o slogan foram feitos em São Paulo. A caixa e o charuto foram feitos na Bahia. O vidro, que comecei a produzir aqui, passará a ser feito em São Paulo, onde custa menos. O Rio precisa da visão empresarial de São Paulo ¿ queixa-se Sande, lembrando que a embalagem representa 40% do custo do produto. A expectativa de produção é de 25 mil por mês.

Uma das mais antigas fábricas do país, a baiana Dannemann, fundada em 1873, e comandada hoje pelo grupo suíço Burger, produz mais de 500 mil charutos e 90 mil cigarrilhas por mês, o que resulta num faturamento em torno de US$ 7 milhões por ano. Cerca de 40% da produção são exportados para, principalmente, Alemanha e Suíça.

A empresa cuida de todos os passos da produção, do plantio das sementes à produção. O objetivo, segundo Raimundo Sampaio, diretor da companhia no país, é dar mais qualidade ao produto.

A tradição também é mantida na baiana Menendez e Amerino, que, no ano passado, faturou cerca de US$ 6 milhões. A empresa, que fabrica 2,5 milhões de charutos, possui apenas uma fábrica em São Gonçalo dos Campos, a 100 km de Salvador, e uma plantação exclusiva para produzir capa. Os charutos são feitos de forma artesanal por quase 300 mulheres.

¿ Passa tudo de pai para filho e de mãe para filha. As técnicas são secretas. Não há uma escola para isso ¿ afirma Sande.

Empresas baianas como Josefina Tabacos, MR Charutos e Taimperbar também lançam novos produtos a cada ano.

O mercado interno também se torna lucrativo. Bem mais barato que os charutos cubanos, os nacionais já representam cerca de 65% das vendas nas tabacarias e restaurantes.

¿ O Rio de Janeiro também tem crescido no mercado. Apesar de ser uma cidade litorânea, o consumo tem aumentado. Porém, São Paulo ainda representa 40% das vendas nacionais. Experimentar charuto é algo muito regional. No Rio, a preferência é por sabores mais suaves e no Sul, é pelos mais fortes ¿ completa Sande, da R&S.

No Esch Café, famoso restaurante do Rio com pontos no Centro e no Leblon, a tradição de fumar charuto é o ponto forte da casa. Alguns pratos foram desenvolvidos especialmente para incentivar uma degustação de charuto após a refeição.

¿ O fumo da Bahia é de ótima qualidade e possui características próprias. Por isso, no restaurante do Leblon vendemos várias marcas nacionais. E as vendas dos brasileiros têm crescido muito ¿ explica Edgar Esch, sócio do restaurante.