Correio Braziliense, n. 21470, 28/12/2021. Política, p. 2

Militares balançam no apoio a candidatos

Ingrid Soares
Cristiane Noberto


Berço de formação de Jair Bolsonaro, as Forças Armadas compõem uma parcela importante da base política do presidente da República. A tendência, nas eleições do próximo ano, é de que o  ex-capitão continue com o apoio dos militares. Entretanto, uma parte dos fardados busca uma  alternativa, em reação à aproximação do presidente com o Centrão, bloco até então criticado por  ele próprio. Se em 2018 militares bolsonaristas cantarolavam “Se gritar pega Centrão, não fica  um, meu irmão”, em 2021, o presidente cerrou fileiras com o PL de Valdemar Costa Neto, conde nado no caso mensalão.

A parcela de militares decepcionada com Bolsonaro tende a apoiar um ex-colaborador do presidente:  o ex-ministro da Justiça Sergio Moro (Podemos). Um outro grupo, menor, pode ainda votar no  ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A fim de evitar a sangria eleitoral, Bolsonaro tem  se empenhado em manter a adesão dos fardados de baixa patente, além das polícias militares e federais. O reajuste salarial incluído no Orçamento de  2022, manobra que enfureceu diversas categorias do funcionalismo público, faz parte desse  movimento.

Para os bolsonaristas, no entanto, essas flutuações não alteram o quadro geral. Na avaliação do  deputado federal Capitão Augusto (PL-RS), o apoio dos militares ainda é majoritário ao presidente. “Os militares se identificam demais com o presidente, não é de agora. São mais de 30  anos da vida pública dele. Bolsonaro vai ter total apoio novamente. Não acredito que milita res deixariam de votar no Bolsonaro para votar no Moro”, avalia. “Vejo que, internamente, na  caserna, o pessoal tem uma admiração muito grande por Moro pelo período em que ele esteve à  frente da Lava Jato. Mas daí achar que o pessoal vai deixar de votar no Bolsonaro para votar Moro, é um longo passo. Para a reeleição, Bolsonaro vai continuar contando com o total apoio dos militares, não só das Forças  Armadas, mas das polícias militares e bombeiros do país”, acredita o parlamentar.

Interlocutores do Ministério da Defesa ouvidos pelo Correio, em caráter reservado, apontam que  ainda não há uma alternativa na terceira via que se sustente. “O Bolsonaro parece bobo, mas é um  excelente estrategista. Cada vez mais os militares irão se inserir na política. Não raciocinamos com desgaste da instituição”, descreve um oficial.

Para Raquel Borsoi, analista de risco político da Dharma Politics, não é possível determinar  com precisão a forma como as Forças Armadas irão se comportar em 2022. “Podemos pensar em  representantes das Forças que estão bem envolvidos no universo da política e que, provavelmente,  permanecerão alinhados ao presidente, como é o caso do ministro da Defesa, Walter Braga Netto. Mas não é o retrato fiel de todo o grupo, como se ele fosse homogêneo”, argumenta.

Politização 

Ela cita, por exemplo, o general Santos Cruz, que se juntou a Sergio Moro. “Ele é um contra ponto ao consenso errôneo de que as Forças Armadas, em sua integralidade, estão alinhadas a  Bolsonaro. Santos Cruz será um interlocutor entre Moro e parte do setor que, assim como ele,  tem certa frustração com Bolsonaro”, acredita Borsoi. “É importante lembrar que candidatos à  esquerda também têm estabelecido diálogos com as Forças, como Lula e Ciro, o que confirma o  fato de que elas se tornaram atores relevantes no processo político”, observa.

O cientista político Cristiano Noronha, da Arko Advice, também considera forte o vínculo de Bolsonaro com militares, mas não vê politização nos quartéis. “Uma  coisa são as pessoas que ocupam posições no governo, por escolha do presidente; outra coisa são  as Forças Armadas serem usadas politicamente, o que não acho que esteja acontecendo. Não tem uso  político das Forças Armadas como instituição”, acredita Noronha. “Elas não têm se envolvido em  batalhas ou apoios políticos do presidente de forma ostensiva. Existe sim, participação  grande, mas não quer dizer maior politização da instituição como um todo”, acrescenta.

Ele também aposta em uma fissura nas eleições, mas não crê em erosão de votos na candidatura do  presidente. “Uma parte (dos militares) deve aderir à campanha de Moro, mas, majoritariamente,  vai com Bolsonaro. A tendência é de que, independentemente do resultado da eleição, as Forças  mantenham o comportamento institucional. Isso significa respeitar o resultado das urnas sem  qualquer tipo de problema ou posicionamento contrário ao que for manifestado pelas urnas”, ressalta  Noronha.

Na visão de Pedro Célio Borges, sociólogo e analista político, o comportamento de Bolsonaro  nos últimos tem sido nocivo para as Forças Armadas. “Durante um bom tempo, até o 7 de setembro  deste ano, Bolsonaro atacou a ordem democrática e procurou subordinar as Forças Armadas a um  ditame”, opina. “Porém, tentou fazer isso utilizando os membros mais decisivos e importantes e  não as Forças Armadas como instituição. Esse envolvimento não tem sido bom e fez com que militares  se sintam incomodados”, avalia.

Segundo Borges, os fardados se dividem entre apoio e desgaste da imagem do presidente dentro  dos quartéis. “Bolsonaro continua com grande apoio no meio militar, mas não é irrestrito, nem  absoluto como vinha sendo. Vão começar a surgir vozes dissidentes”, frisa.