O Globo, n. 32784, 11/05/2023. Política, p. 8

Com bên­çãos do pai, Flá­vio mira cam­pa­nha à pre­fei­tura do Rio

Bernardo Mello


Após ter recebido sinalizações positivas do pai nos bastidores, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aprofundou nas últimas semanas a articulação para concorrer à prefeitura do Rio em 2024. Homens de confiança do parlamentar afirmam que o apoio irrestrito do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ainda não demonstrado publicamente, é condição necessária para dar solidez à candidatura. Além de mirar desafetos e eleitores descontentes com o atual prefeito Eduardo Paes (PSD), aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Flávio já foi aconselhado a desarmar um conflito com seu suplente no Senado, o empresário Paulo Marinho, que poderá assumir o mandato no Congresso em caso de vitória.

Marinho, um dos conselheiros mais próximos de Bolsonaro na campanha de 2018, rompeu com o então presidente no início do mandato. Em 2020, ele acusou Flávio de ter tomado conhecimento com antecedência da Operação Furna da Onça, ponto de partida da investigação sobre as “rachadinhas” envolvendo seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Na ocasião, Flávio disse que Marinho tentava prejudicá-lo de olho em “ganhar no tapetão” a cadeira de senador.

Interlocutores de Flávio avaliam que há brecha para distensionar a relação, já que Marinho tem acenado não ter mais intenção de antagonizar com o senador. Além disso, aliados que debatem a candidatura dentro do PL consideram que o palanque gerado pela eleição à prefeitura do Rio, ganhando ou perdendo, tem maior potencial de mobilizar o bolsonarismo para 2026 do que apenas concluir o mandato como senador.

Este argumento, endossado pelo presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, foi levado a Bolsonaro para liberar a candidatura do filho, após participações erráticas nas eleições cariocas de 2016 e de 2020. Na primeira, quando o próprio Flávio foi candidato, pelo PSC, Bolsonaro considerava que qualquer revés poderia prejudicar sua própria candidatura presidencial dali a dois anos, e se irritou com episódios como o desmaio do filho durante um debate na TV. Na segunda, Bolsonaro apoiou de forma discreta o então prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) e chegou a fazer acenos a Paes. Segundo interlocutores, o ex-presidente deu sinal verde para Flávio tocar suas articulações.

Em meio à expectativa de polarizar a disputa com o atual prefeito, o senador busca atrair lideranças políticas descontentes com Paes. Um dos alvos é o prefeito de Belford Roxo e recém-empossado presidente estadual do Republicanos, Waguinho, marido da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, que se afastou do atual prefeito fluminense depois de ambos apoiarem a eleição de Lula. Daniela assumiu o ministério desbancando um aliado de Paes, o deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ). Paulo Marinho, que dirigia o PSDB à época da eleição de Paes, também teve rusgas com o prefeito por conta de acordos políticos.

Gafes em primeiro teste

Com o mergulho na candidatura, Flávio tem ensaiado um discurso de campanha voltado para questões de segurança e de ordem pública, além de tentar associar Paes a pontos negativos do governo Lula para buscar o eleitorado de classe média e alta. Em um evento do PL, em março, no qual teve sua candidatura lançada por Valdemar, Flávio cometeu gafes ao testar a plataforma em um discurso. Em certo ponto, disse que havia visitado naquela manhã a Cidade da Polícia, “que fica pertinho da Maré”. O local é vizinho a outra comunidade, a do Jacarezinho.

Em outro momento, ao associar lideranças de esquerda a facções do tráfico de drogas, Flávio citou um vídeo no qual uma pessoa, identificada como mulher de um presidiário no Rio Grande do Norte, reclama da governadora Fátima Bezerra (PT) pelo tratamento aos detentos afirmando que “foi com os votos dos presídios que ela foi eleita”.

— A gente não quer mais esse discurso barato de chegar na favela e vender ilusão para ganhar voto. É como disse a parente do preso: na hora de pedir voto vem na periferia, depois dá as costas como covarde —disse Flávio.

Interlocutores do senador criticam essa linha de argumentação, por generalizar o envolvimento com atividades criminosas entre moradores de comunidades. Um problema semelhante apareceu na disseminação bolsonarista da narrativa falsa de que a sigla “CPX”, em um boné usado por Lula durante visita ao Complexo do Alemão na campanha eleitoral de 2022, seria uma gíria usada por traficantes para designar “comparsa”. A sigla, na verdade, é uma abreviatura de “complexo” e usada por moradores.

Aliados afirmam, por outro lado, que o senador tem ajustado o enfoque nas falhas da atual gestão. Uma possibilidade avaliada pelo entorno de Flávio é trazer para a pré-campanha o marqueteiro Duda Lima, próximo a Valdemar Costa Neto, que atuou na campanha de Bolsonaro em 2022.