Título: Gestão em Choque: Desinformação
Autor: Samantha Lima, Mariana Carneiro e Bruno Rosa
Fonte: Jornal do Brasil, 10/08/2005, Economia & Negócios, p. A17

Desconhecimento de regras para obter benefício ajuda a engordar as filas nos postos de atendimento do INSS

As longas filas que se tornaram o símbolo do atendimento prestado nos postos do INSS são resultado, em parte, da dificuldade do beneficiário em obter informações básicas sobre seus direitos. O suplício ao qual são submetidos se agrava com o despreparo dos funcionários, que aparentam desconhecer as normas que regem a concessão dos benefícios, e indica um dos principais focos a ser atacados pelo que o governo chama de choque de gestão. Mal-orientados, muitos são obrigados a retornar inúmeras vezes às agências, aumentando a demanda por atendimento. A situação piora por efeito de constantes mudanças nas regras, resultado de reformas que tentaram reduzir o tamanho do rombo do sistema, como mostra a quarta reportagem da série que o Jornal do Brasil publica sobre Previdência. O desconhecimento sobre as alterações nas regras foi demonstrado pela maioria das pessoas cuja peregrinação aos postos de atendimento foi acompanhada pelo JB, mesmo entre os que já tinham sido atendidos anteriormente. Em alguns casos, candidatos à aposentadoria ignoram uma das principais mudanças, a que alterou o conceito de tempo de serviço para tempo de contribuição.

Domingos Rodrigues, de 58 anos, enfrentou uma longa fila no posto do Méier para tirar apenas uma dúvida. Contribui para a Previdência há mais de 20 anos e não sabe se já pode se aposentar. Durante a espera, outras pessoas davam informações distintas.

¿ Tenho que enfrentar a fila só para saber o que fazer. Cada um fala uma coisa e já penso em me aposentar. Só com meu salário, não estou conseguindo arcar com as despesas ¿ disse Rodrigues.

Maria Neves Gomes, de 61 anos, tenta há oito meses dar entrada em seu pedido de aposentadoria. A cada visita, depois de horas de espera, sempre há algum documento errado ou uma assinatura faltando.

¿ Primeiro, os funcionários falam que só precisa de um documento. Quando retorno, um outro diz que falta uma série de outras coisas. É uma situação horrível ¿ disse, descrevendo o atendimento que o próprio secretário-executivo do ministério, Carlos Eduardo Gabas, classificou ontem de ¿constrangedor¿.

O sistema previdenciário da iniciativa privada, a cargo do INSS, foi alvo de duas reformas nos últimos oito anos. A primeira delas, em 1998, foi implementada com a aprovação da Emenda Constitucional 20, que alterou regras de concessão de benefícios criadas na Constituição de 1988. A principal mudança foi na forma de cálculo do benefício, invalidando a regra que considerava média dos últimos 36 salários de contribuição. Em substituição, foi criada, na Lei 9.876, de 1999, a regra que estabelece como base para o benefício a média dos maiores salários (os 80% mais altos).

O conceito de ¿tempo de serviço¿ também mudou e foi trocado pelo ¿tempo de contribuição¿. Assim, as mulheres só podem se aposentar ao registrarem 360 contribuições (12 contribuições anuais em 30 anos) e os homens, após 420 contribuições (12 contribuições anuais em 35 anos).