Título: Ducha de água fria no otimismo
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/08/2005, Economia & Negócios, p. A20

O mercado reagiu mal ao depoimento do publicitário Duda Mendonça na Comissão Parlamentar de Inquérito que apura denúncias de corrupção nos Correios. A preocupação com o cenário político voltou a dar o tom dos negócios na Bolsa de Valores de São Paulo e alimentou a alta do dólar, afetado também pela intervenção do Banco Central, comprando moeda americana. A leitura dos investidores foi que a imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu arranhada com as informações prestadas por Duda Mendonça. O publicitário confirmou à CPI que recebeu dinheiro vivo e que alguns repasses da agência SMPB, de Marcos Valério, vinham de contas do exterior. E acrescentou que, para receber o pagamento referente à campanha do PT à Presidência da República, em 2002, teve que abrir uma conta em paraíso fiscal. Em apenas uma das remessas, Duda confirmou ter recebido R$ 300 mil em espécie. De acordo com ele, os recursos vinham em `pacotes¿ e teriam origem em caixa dois.

A repercussão política do depoimento foi acompanhada de perto pelos operadores do mercado. As declarações do deputado Álvaro Dias (PSDB-PR) sugerindo o impeachment do presidente Lula precipitaram ordens de venda de ações. O Ibovespa, principal índice da bolsa paulista, fechou em baixa de 1,78%, aos 26.633 pontos. O volume financeiro totalizou R$ 1,911 bilhão, acima da média diária do ano, o que evidencia a movimentação.

O tombo só não foi pior graças à safra de resultados financeiros positivos de grandes empresas e ao impacto da decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre os papéis de siderurgia e mineração.

Entre as ações mais negociadas na Bovespa, figuraram as preferenciais `A¿ da Vale do Rio Doce e as ordinárias da Companhia Siderúrgica Nacional. Os papéis subiram 1,25% e 1,05%, respectivamente. A mineradora saiu derrotada no julgamento do Cade, mas seus lucros no semestre foram tão expressivos que neutralizaram o impacto da decisão sobre as cotações.

No mercado de câmbio, já afetado pela turbulência política, a atuação do BC pegou os investidores de surpresa. O dólar comercial fechou em alta de 2,89%, a R$ 2,346, na maior alta percentual em um só dia desde 31 de maio do ano passado ¿ na ocasião, a moeda americana subiu 3,23%.

O BC anunciou, perto do meio-dia, um leilão para compra de dólares. A reação foi imediata no câmbio, com a divisa chegando a ser negociada acima de R$ 2,35. A intervenção surpreendeu especialmente devido às declarações dadas esta semana pelo secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. De acordo com Levy, o governo não via ¿urgência¿ em voltar a comprar dólares no mercado à vista, em virtude da queda livre das cotações, que estão no patamar mais baixo desde 2002.

Apesar do anúncio, operadores do mercado acreditam que o BC não conseguiu comprar dólares, já que o valor oferecido pela instituição, de R$ 2,298 para a compra, não agradou quem tinha divisas para vender.

¿ A percepção do mercado é a de que nenhuma proposta foi aceita pelo Banco Central. Se houve alguma compra foi de valor pequeno ¿ avaliou Miriam Tavares, diretora da corretora AGK.

Para Julio César Vogeler, da corretora Didier Levy, a ação do BC teve como objetivo estabelecer um piso para o dólar.

¿ O BC, querendo ou não, estabeleceu um piso psicológico de R$ 2,30 para o dólar ¿ afirmou o analista.

De acordo com ele, daqui para frente o mercado vai ficar bem mais ¿especulativo¿, à espera de novas atuações da autoridade monetária.

¿ Acho que amanhã vamos ter grandes emoções novamente.

Com agências