Título: Pronunciamento preparado ao longo da semana
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 13/08/2005, País, p. A4

Nos últimos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva discutiu com vários interlocutores a conveniência e o conteúdo de um pronunciamento. Na manhã de quarta-feira, consultou os aliados do PMDB em reunião no Planalto, segundo um dos presentes, mas não informou sua decisão.

Um dos receios do presidente era o de ser superado por novas revelações das investigações. Na noite de quinta, por exemplo, ele havia sido informado sobre a entrevista do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, para a revista Época. Valdemar contou à revista que o apoio do PL à coligação com o PT, em 2002, foi obtido em troca da promessa de 10 milhões de reais.

Embora o texto do discurso e a transmissão pela Radiobrás estivessem preparados desde a véspera, Lula manteve o suspense até minutos antes da fala, quando a equipe ministerial já estava instalada na churrasqueira da Granja do Torto, aguardando o início da reunião.

No discurso, Lula aproveitou para dizer que não havia mudado e lembrou a missão do Partido dos Trabalhadores:

- O PT foi criado justamente para fortalecer a ética na política e lutar ao lado do povo pobre e das camadas médias do nosso país. Eu não mudei e, tenho certeza, a mesma indignação que sinto é compartilhada pela grande maioria daqueles que nos acompanharam nessa trajetória.

A reunião ministerial durou todo o dia e serviu para o presidente esboçar, junto aos ministros, uma reação e a discutir medidas para tirar o governo da defensiva.

Uma das principais medidas apresentadas foi um projeto para reforçar o combate ao crime organizado e à corrupção, idealizado pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

Segundo Bastos, o projeto é parte de uma estratégia ampla de combate à lavagem de dinheiro. A intenção é realizar uma ação integrada de diversos órgãos do governo, para fazer o rastreamento e o bloqueio de recursos desviados para o exterior. Além disso, o país promoveria avanços nos acordos de cooperação internacional e uma definição dos crimes que antecedem a lavagem de dinheiro.

A proposta é sintomática, já que durante o pronunciamento, Lula disse que não tinha como punir os culpados:

- Se estivesse ao meu alcance, já teria identificado e punido exemplarmente os responsáveis. Mesmo sem prejulgá-los, afastei imediatamente os que foram mencionados em possível desvio de conduta para facilitar as investigações - afirmou.

Mesmo assim, membros do PT criticaram o presidente:

- Frustrante! Ele tinha que dizer não que estava indignado, mas o que iria fazer como líder - criticou o senador e ex-ministro Cristóvam Buarque (PT-DF).

Auxiliares de Lula argumentaram que Lula não quer extrapolar as prerrogativas de presidente. ''Ele deixa que o Congresso aponte e o Judiciário julgue os responsáveis'', disse um assessor. Segundo ele, o pronunciamento ficou ''no limite'' do que Lula considera possível dizer em público.