Título: Gestão em choque: Suplício e Impasse
Autor: Samantha Lima, Kelly Oliveira e Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 13/08/2005, Economia & Negócios, p. A17

Greve freia análise de pedidos de benefício e prolonga sofrimento da população em postos do INSS

Além de filas, falta de infra-estrutura e despreparo dos funcionários, o candidato a um benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) encontra hoje outro obstáculo para conseguir atendimento nos postos: a greve. Este ano, a paralisação ¿ que já pode ser considerada uma tradição no calendário dos servidores ¿ dura mais de 70 dias e deixou de braços cruzados 80% dos 35 mil servidores da Previdência, de acordo com os organizadores. A Justiça determinou que a greve seja encerrada até a próxima quarta-feira. Mesmo se levada a cabo a decisão, o movimento deixará como legado um longo período de sofrimento aos beneficiários. O atendimento só será normalizado em um mês, reconhece o INSS. A greve reduziu em 26% o ritmo de análise de processos, que caiu de 480 mil para 352 mil no mês de junho, de acordo com o INSS. Em entrevista ao Jornal do Brasil, o presidente do órgão, Valdir Moysés, informou que já há uma estratégia para normalizar o atendimento após o fim do movimento. São estudadas a abertura dos postos aos sábados e a ampliação do horário de funcionamento.

¿ Deslocaremos servidores para o front de atendimento, que será normalizado em duas semanas. A análise de processos ficará para um segundo momento, com mais duas semanas.

Os servidores interromperam as negociações na última quinta-feira depois de o governo anunciar que só pagaria parcialmente os dias parados. Dos grevistas, 5,2 mil tiveram o contra-cheque zerado.

¿ Eles não quiseram nem ouvir a proposta de aceitarmos a reposição de metade dos dias parados ¿ afirmou o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça, após reunião que durou cerca de três horas na última quinta-feira.

Para o diretor da Federação Nacional dos Servidores da Previdência Social (Fenasps), Henrique Martini, o governo deveria pagar os dias parados, já que os servidores prometeram repor as horas não trabalhadas.

¿ Não podemos aceitar a não-reposição, já que vamos colocar o serviço em dia ¿ afirmou o diretor da Fenasps.

No Rio, mais da metade das agências está fechada ou funcionando parcialmente. A psicóloga Maria Rodrigues, de 34 anos, sente na pele a paralisação.

¿ Sem greve, espero duas horas para ser atendida. Em greve, é necessário, no mínimo, duas visitas para tentar a sorte. Digo sorte porque aposentar-se nesse país sem sofrimento é impossível. Marcar perícia, então, é uma tortura ¿ resume.

Um dos pontos das negociações que vêm causando impasse é a gratificação dos servidores. O governo propõe distribuir os R$ 140 milhões destinados a gratificações de acordo com o desempenho do funcionário, mas os servidores querem valores fixos, por cargo. O governo também propôs que a reestruturação do plano de carreira tenha efeitos financeiros só em 2007. Governo e grevistas tentavam, no fim da noite de ontem, nova rodada de negociação, ainda sem resultado. Se os servidores não voltarem ao trabalho na próxima quarta-feira, como determina a Justiça, a multa para o governo será de R$ 100 mil por dia.

¿ Nem na ditadura, no governo Sarney ou no de Fernando Henrique Cardoso a negociação foi tão dura. A greve chegou a esse ponto porque o governo mostrou incompetência em negociar e pagou para ver ¿ avalia Martini, da Fenasps. ¿ Aceitamos atrasar a gratificação, mas não negociamos corte de ponto.

Com Bruno Rosa