Título: Surdez por conveniência
Autor: Claudia Bojunga
Fonte: Jornal do Brasil, 16/08/2005, Saúde & Ciência, p. A12

A recorrente reclamação feminina de que os homens não prestam atenção ou sequer escutam ao que falam tem algum fundamento científico. Uma pesquisa inglesa atesta que eles demoram mais a processar a voz delas do que a de pessoas do mesmo sexo.

- A voz feminina é mais complexa que a masculina, devido a diferenças no tamanho e no formato das cordas vocais e da laringe - diz um dos pesquisado res, o professor de medicina do Cognition and Neuroimaging Laboratory da Universidade de Sheffield, Michael Hunter. As mulheres têm uma melodia natural ao falar, o que gera uma gama de freqüências de ondas mais elaborada que os sons emitidos pelos homens. A recepção desses sinais também passa por sensores diferenciados.

Já se sabe que o cérebro tem uma área, do lado esquerdo, que reconhece a linguagem e é responsável pelo entendimento da fala e da escrita. O estudo, publicado pela revista NeuroImage, vai mais longe. Demonstra que, dependendo de quem emite os sons, seções específicas do cérebro são ativadas. Assim, quando um homem ouve a voz de uma mulher, a área cerebral que responde é a da audição. Se escuta alguém do mesmo gênero, a parte que retorna é a conhecida como ''o olho da mente'', onde são comparadas as experiências do outro com sua própria.

- Esta, realiza menos associações, tem uma percepção mais direta - afirma Paulo Belmonte de Abreu, psiquiatra, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e membro da Associação Brasileira de Pediatria.

A área da audição fica do lado da têmpora, em cima da orelha. A segunda, ''o olho da mente'', localiza-se numa parte mais profunda, no centro do cérebro, na altura da nuca.

A pesquisa acompanhou 12 voluntários do sexo masculino que foram submetidos a um exame denominado Ressonância Magnética Funcional. Enquanto ouviam fitas com mensagens gravadas por homens e mulheres, seu cérebro era escaneado.

O trabalho constatou que o consumo local de oxigênio quando o homem ouvia a uma mulher era maior, ou seja o organismo realizava mais ''esforço''.

Segundo Abreu, isso é um indício que pode explicar a dificuldade masculina em escutar as mulheres. A advogada Cláudia Petroni, de 40 anos, concorda com o estudo, por experiência própria. Casada com Alexandre Petroni, de 51 anos, há 19, conta que o marido nem sempre registra o que fala.

- Um vez avisei que tínhamos um casamento, que ia ser maravilhoso, enquanto ele assistia a um jogo de futebol. Achei que ele estava ouvindo. No dia da festa não o encontrei. Quando vejo, chega ele, em cima da hora, de sunga, todo molhado, vindo da praia. Tinha esquecido.

Sílvio Lima, de 42 anos, casado há dez com Elza Lima, de 46, assume essa característica:

- Principalmente na questão financeira - brinca.

Já Edson Jordão, de 52 anos, casado há 30 anos, discorda:

- Quando interessa, a gente ouve com muita atenção - completa.