Título: Ministro Palocci vacina a economia
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 18/08/2005, País, p. A2
Num esforço para evitar que a crise política contamine a economia, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, foi rápido ao responder as acusações de que recebeu R$ 50 mil mensais de empresa de lixo em troca de favorecimento em licitação na prefeitura de Ribeirão P reto. Em entrevista coletiva convocada para ontem, o ministro demonstrou segurança ao negar com veemência denúncias contra ele e dizer que permanecerá à frente da pasta, sob as bençãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Antes de responder às questões dos jornalistas, Palocci fez um breve pronunciamento, no qual foi logo avisando que não deixaria o cargo. O ministro abriu o discurso afirmando que telefonou para o presidente antes da entrevista e, durante a conversa, sua demissão foi descartada, embora ele tenha o deixado à vontade para afastá-lo. Em seguida, rebateu todas as acusações e denúncias que pesam sobre ele.
¿ Quero negar categoricamente essas acusações porque são falsas. Estou absolutamente tranqüilo porque sei do que fiz. E sei do que não fiz. Antes de vir aqui, telefonei ao Lula e disse a ele que iria dar estas explicações, mas que iria deixá-lo absolutamente tranqüilo sobre a minha posição ¿ afirmou o ministro.
As declarações de Palocci se apoiaram em dois eixos principais, ambos com o nítido propósito de acalmar o mercado: primeiro, o ministro se dispôs a esclarecer todas as acusações já feitas e eventuais fatos novos; segundo, mesmo que deixe o cargo, a política da Fazenda não será mudada, e a economia poderá resistir a turbulências.
Durante as duas horas e meia de entrevista, Palocci se preocupou em reafirmar a ¿solidez¿ dos fundamentos econômicos e deixar claro que aposta na manutenção da atual política econômica, independentemente de quem esteja no comando do ministério da Fazenda ¿ ¿ninguém é insubstituível¿, sublinhou várias vezes ¿ e negou ter sido ¿traído¿ por Buratti, até porque não existiria, segundo ele, uma relação de confiança estabelecida entre os dois. Semana passada, setores da oposição enviaram recados ao Planalto de que a repetição retórica da traição poderia passar a impressão de inépcia do governo.
¿ Falei com Buratti pela última vez em 2003. Nem me lembro do teor da conversa ¿ disse Palocci querendo aparentar distância do ex-assessor. O ministro Palocci revelou bom senso e seriedade ao reconhecer a gravidade e a culpa de parcela do PT, depois de lembrar discurso em que o presidente Lula admitiu que o partido deve desculpas à sociedade.
¿ Acredito que uma parcela do partido tem culpa sim, mas tem de deixar que as investigações sejam feitas. Assim como o presidente reconheceu, ao dizer que achava que o partido também deveria pedir desculpas, acredito nisso ¿ afirmou.
O único momento em que Palocci elevou a voz foi para criticar promotores do Ministério Público do Estado de São Paulo responsáveis pela tomada do depoimento do advogado e o ex-assessor, Rogério Tadeu Buratti.
¿ Os promotores traduziram as palavras do depoente que foi colocado em situação constrangedora. Não se pode jogar informação sem apuração ¿ reclamou.
A conduta de estadista, o tom pausado e a maneira enfática de se expressar, não deixando perguntas sem respostas, a tentativa de se descolar de Buratti, as críticas ao Ministério Público, bem como o conteúdo de exaltação aos pilares da economia num recado claro ao mercado financeiro, foram estratégias amplamente discutidas nos últimos dias entre Palocci, o presidente Lula e o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que o instruiu do ponto de vista jurídico. A preocupação no seio governista era de que as denúncias contra Palocci interferissem a economia, até então considerada o ponto forte do governo Lula.
A blindagem ao ministro permanecerá durante a semana para que a situação permaneça sob controle. Lula deve fazer um pronunciamento de apoio ao ministro entre hoje e amanhã, reiterando a permanência de Palocci no cargo e reafirmando que não haverá alterações na política econômica. A nova fala de Lula também servirá para o presidente dar uma resposta mais contundente à crise que envolve o governo.
As linhas do discurso presidencial seriam discutidas em reunião ontem à noite na Granja do Torto entre Lula e o chamado gabinete da crise, composto pelos ministros da Coordenação Política, Jaques Wagner, da Casa Civil, Dilma Roussef, da Secretaria Geral, Luiz Dulci, da Justiça, Thomaz Bastos, o próprio Palocci e o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes.
Outra preocupação do governo é a retomada da agenda do Congresso. Desde a última semana, o ministro Jaques Wagner tem trabalhado no sentido de colocar na praça uma pauta mínima, num acordo envolvendo governo e oposição.
Com Fernando Exman e Renata Moura