Título: Batalha por sinagoga completa ação
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Fonte: Jornal do Brasil, 19/08/2005, Internacional, p. A9
Colonos radicais entrincheirados em templo resistiram com pedras, areia e até ácido aos militares que foram desalojá-los A expulsão dos colonos judeus da Faixa de Gaza se tornou mais tensa e violenta
KFAR DAROM, Faixa de Gaza - A expulsão dos colonos judeus da Faixa de Gaza se tornou mais tensa e violenta ontem, quando o Exército foi obrigado a usar equipamento antidistúrbio para invadir duas sinagogas, em Neve Dekalim e Kfar Darom. A missão era retirar os ativistas - muitos deles não-moradores das colônias - que transformavam os templos nos últimos bastiões da resistência ao Plano de Desligamento.
A situação mais dramática aconteceu em Kfar Darom, onde os manifestantes só foram controlados no fim da tarde. As tropas usaram canhões de água contra a multidão, entrincheirada no teto da sinagoga. Soldados que tentavam subir por escadas eram recebidos com pedras, ovos, pedaços de concreto, balas de tinta e até ácido. Vários agentes ficaram queimados. Outro foi levado ao hospital, inconsciente, depois de escorregar do segundo andar do prédio, em um ponto banhado em óleo de cozinha. No total, 44 pessoas ficaram feridas: 30 agentes de segurança e 14 manifestantes.
O general Dan Harel, comandante da operação, afirmou que os membros da resistência poderão enfrentar julgamento por distúrbio violento. Foi misturada tinta verde e azul na água lançada contra o protesto, para identificá-los.
- O que vimos aqui vai além de todos os limites de manifestação pacífica - justificou.
Enquanto isso, um container com guardas era içado por um guindaste até a laje, contornada por arame farpado, onde tremulavam fitas laranjas - a cor da resistência ultradireitista. Gritando ''judeus não expulsam judeus'', os radicais começaram a ser arrastados para fora da sinagoga. A ação teve que ser rápida, pois temia-se que o teto cedesse, pelo excesso de peso. Pelo menos 50 pessoas foram presas.
Em outro incidente, palestinos abriram fogo contra o comboio do Exército que retirava colonos e radicais de Gush Katif - como os israelenses chamam o bloco de assentamentos sionistas na Faixa de Gaza. Um soldado ficou levemente ferido.
Mais cedo, as tropas também conseguiram retirar, à força, cerca de 2 mil jovens radicais da sinagoga de Neve Dekalim, até ontem a maior colônia de assentamento judeu em Gaza. Os ativistas tinham prometido que sairiam do local à tarde, mas não mantiveram a palavra. Sentados no chão, com mãos e pés entrelaçados, foram carregados, um a um, para fora do templo. Para cada colono eram necessários quatro soldados.
- Deus quer que eu fique aqui, que todos fiquemos aqui - respondia um garoto de 15 anos, ao ouvir policiais tentando convencê-lo a deixar a sinagoga.
- Que isso se torne uma mancha em seus corações para sempre - gritava outro adolescente, enquanto era levado para o ônibus.
Do lado de fora, as tropas eram recebidas por um grupo de meninas, que também gritavam:
- Vocês estão tirando judeus de uma sinagoga. A última vez que isso aconteceu foi no Holocausto.
Um soldado religioso, que inclusive usava um quipá embaixo do quepe, sofreu um ataque de pânico. Exausto, molhado de suor e chorando, esteve a ponto de desertar.
- Não posso continuar - disse, antes de também ser retirado do local pelos companheiros.
O capitão das Forças de Defesa de Israel, Yael Harman, reconheceu que o esvaziamento de Kfar Darom e Neve Dekalim foram as ações mais desgastantes para as tropas judaicas, obrigadas a ouvir gritos de ''blasfêmia'' e a saudação nazista ''Heil, Hitler'' enquanto trabalhavam.
- Entrar nas sinagogas é traumático. Muitos dos soldados são religiosos e é difícil para eles conceber a idéia de invadir o templo para expulsar iguais. Mas é isso que têm que fazer, pela segurança de todos.
A luta dos jovens colonos é inspirada na caótica evacuação do assentamento Yamit, no Sinai, em 1982. Centenas de ultranacionalistas se trancaram em sinagogas, desobedecendo à ordem de deixar a antiga colônia.
Em Kfar Yam, Aryeh Yitzhaki foi preso por ter recebido as tropas armado com um rifle, prometendo que faria ''de tudo'' para não ter que sair de casa.
Ontem, foram totalmente esvaziados os assentamentos de Neve Dekalim, Shirat Hayam, Netzer Hazani, Gan Or e Kfar Yam, somando 16 em 21 de Gush Katif. Pouco a pouco, Gaza se torna mais vazia. Segundo dados oficiais, 1.700 colonos judeus foram desalojados só nesta quinta-feira. No total, 70% dos 8.500 assentados já abandonaram suas casas. O Exército calcula que a primeira fase da retirada esteja completa na semana que vem.