Título: Mentira desmascarada
Autor: Clara Cavour
Fonte: Jornal do Brasil, 19/08/2005, Internacional, p. A8

Apesar de o chefe da polícia metropolitana, Ian Blair, afirmar que tudo indicava que Jean Charles era um homem-bomba, o depoimento de um de seus agentes o desmente. O policial que vigiava o prédio em que o brasileiro e dois dos quatro autores dos atentados moravam negou que o eletricista tivesse comportamento suspeito. Seu relatório, de 9h33 do dia 22 de julho, é prova disso:

''Eu observei um homem U/I (termo para 'não-identificado'), IC1 (branco) de cabelo escuro, jaqueta jeans e calça sair do prédio. Não carregava nada. Não pude confirmar se ele era suspeito'', diz o depoimento obtido pela ITV.

O vigia, que chegou ao posto de trabalho às 6h30, disse que estava no banheiro quando Jean saiu do apartamento, não podendo ligar a câmera que possuía para registrar o movimento do prédio. ''É por isso que não há imagens desse homem'', afirmou.

''Quando ele saiu do meu campo de visão, eu chequei as fotografias e sugeri que seria importante que outra pessoa avaliasse'', continuou.

Nesse momento, duas equipes de vigilância faziam uma ronda na Scotia Road, rua onde Jean morava, e uma outra, a CO19, de atiradores estava de prontidão próximo ao local. Um dos agentes armados seguiu Jean Charles. O atirador, de codinome Hotel 1, escutou no rádio que o brasileiro teria saído do ônibus em Brixton às 9h47 e reembarcado às 9h49, por razões desconhecidas. Às 10h02 desembarcou na estação de Stockwell e foi seguido pelas equipes. Foi quando recebeu ''a descrição e o comportamento'' do eletricista e suspeitou que sua identidade coincidia com a do terrorista etíope Osman Hussain (que tem pele escura, ao contrário do brasileiro).

Dentro do metrô, a responsabilidade passou à CO19, sob ordens do Comando Ouro, chefiado pela policial Cressida Dicks, que sentenciou a morte do brasileiro. Jean foi seguido por Hotel 3, que sentou ao seu lado. Ao ver outros agentes na estação, gritou: ''Ele está aqui''.

''Neste momento, apontei para o homem de jaqueta jeans'', confirmavam os documentos vazados. ''Ele se levantou depois do chamado da polícia e eu o agarrei, colocando-o de volta a seu assento. Foi quando escutei um tiro próximo ao meu ouvido''. Jean Charles, inocente e vítima de uma sucessão de erros estava no chão, como informou um dos agentes ao Comando Ouro: ''man is down''.