Título: Golpe branco na saúde do Rio
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 20/08/2005, Rio, p. A13

Conselho da Zona Oeste denuncia que médicos obtêm licença em hospitais públicos para trabalhar em instituições privadas

Na linha de frente da crise nos hospitais públicos do Rio, profissionais de saúde vêm solicitando licenças médicas de unidades estaduais e municipais para trabalhar em outras instituições, muitas delas, particulares. A afirmação é do Conselho Distrital de Saúde da Zona Oeste que abrange Santa Cruz, Paciência e Sepetiba. Na região, estima-se que pelo menos 150 profissionais de saúde em licença médica mantêm um outro emprego. As denúncias de licenças indevidas foram encaminhadas ontem ao Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj), ao Sindicato dos Médicos (SinMed) e ao Ministério Público estadual. - O servidor não pode permanecer em licença médica numa instituição e continuar trabalhando em outra unidade do serviço público ou clínica particular - explica Adelson Alípio, presidente do conselho da Zona Oeste, informando que as licenças são concedias através do Boletim de Inspeção Médica (BIM).

Segundo Alípio, muitos pacientes têm procurado os conselhos distritais dizendo que nos hospitais públicos são informados de que os médicos ausentes estão atendendo nos seus consultórios. As denúncias não estão restritas aos médicos: também há casos de enfermeiros, auxiliares de saúde e fisoterapeutas em situação semelhante. Num levantamento feito pelo Conselho Distrital da Zona Oeste consta o nome de uma médica que é lotada no Posto de Saúde Ruy da Costa Leite, em Santa Cruz. No entanto, há mais de dois anos ela está de licença para tratamento de saúde e continua trabalhando numa clínica particular, em Santa Cruz.

Segundo o vereador Carlos Eduardo (sem partido), vice-presidente da Comissão de Saúde da Câmara, o salário bruto de um médico com 30 anos de carreira é de R$ 2.694. Neste valor, estão incluídos o triênio de gratificação, o adicional noturno, a insalubridade, a produtividade e o salário base de R$ 941. Uma vez de licença, o médico ganha apenas o salário base e o triênio. Um médico em início de carreira ganha cerca de R$ 1.300 para 24 horas de plantão.

- A lei faculta ao profissional de saúde ter dois empregos e quantos particulares quiser. Não tenho conhecimento de licenças indevidas, mas se esta situação estiver ocorrendo tem de ser apurada - opina o vereador.

Carlos Eduardo lembra, no entanto, que, mesmo doentes, muitos médicos deixam de tirar o BIM para não perder os benefícios incorporados ao salário base.

- São senhores de cabeça branca que continuam trabalhando nas equipes de emergência porque não podem perder estas gratificações para não diminuir a renda familiar - pondera o vereador.

As suspeitas de médicos com licença médica indevida estão sendo apuradas pelo secretário municipal de Administração, Índio da Costa. Segundo o secretário, se alguma irregularidade for comprovada será aberto inquérito administrativo. Segundo Adelson Alípio, apenas no Hospital Estadual Pedro II, em Santa Cruz, há 90 profissionais de saúde afastados. Ele estima que há cerca de 500 profissionais licenciados com BIM no município. A Secretaria Estadual de Saúde informou que 1.200 profissionais de saúde estão licenciados. O quadro geral de funcionários é de 20 mil. Segundo o estado, as licenças são concedidas por médicos peritos lotados na Secretaria Estadual de Administração. Ainda segundo a secretaria, o funcionário que estiver mentindo poderá ser afastado.

- Não descarto que há licenças de profissionais de saúde indevidas, mas devem ser poucas. No entanto, no momento que faltam médicos, esta situação é um crime - diz Maria Celina de Oliveria do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e Previdência.

Os representantes do Cremerj e o SinMed informaram que só vão se pronunciar após o recebimento e a análise das denúncias.