Título: A próxima desculpa do Banco Central
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Fonte: Jornal do Brasil, 21/08/2005, Economia & Negócios, p. A18

O cenário econômico é extremamente positivo... para quem vive de juros. Com o agravamento da crise, as taxas no mercado futuro dispararam e, na sexta-feira, indicavam estabilidade na Selic até o fim do ano. Um pesadelo para o setor produtivo, que apostava no afrouxamento da política monetária como impulso ao crescimento do PIB no segundo semestre e começava a desengavetar investimentos necessários a seus planos de expansão. Claro, os juros futuros não são uma indicação de que a taxa básica permanecerá onde está. Simplesmente, demonstram o grau de estresse entre os investidores com a inclusão do ministro Antonio Palocci no rol de suspeitos nos escândalos de propina e caixa dois que assombram os petistas.

¿ As denúncias chegam num momento em que começa a aumentar a aversão dos investidores estrangeiros ao risco ¿ lembra Mário Mesquita, diretor do Departamento Econômico do ABN Amro Real, que ainda espera uma redução de 0,25 ponto percentual na Selic, em setembro.

Mas muitos já começam a apostar na inércia do Banco Central diante de uma crise cada vez mais imprevisível.

¿ Num momento de instabilidade, o mais cômodo a fazer é manter os juros. O aumento do risco reforça o conservadorismo do BC ¿ afirma Cláudio Monteiro, estrategista-chefe da Fator Corretora e professor de finanças da FGV-SP.

A questão central para os investidores é a probabilidade de manutenção da política econômica, intocada desde os tempos do Malanato. Palocci é o grande avalista de toda essa ortodoxia do BC, que vem mantendo os juros na estratosfera em nome do combate à inflação, mesmo com quatro meses consecutivos de queda de preços pelos IGPs. A equação se complica agora com a tensão no mercado, que elevou a cotação do dólar em quase 3% num único dia. Pela cartilha do BC de Henrique Meirelles, a desvalorização cambial, se confirmada a tendência, pode dar novo ânimo à inflação e forçar o adiamento dos cortes nos juros.

Uma lógica para lá de cruel: mês passado, os juros não caíam por causa do petróleo; na última reunião do Copom, a desculpa foi a crise política; em setembro, pelo andar da carruagem, a alta dos preços pode ser o vilão da vez.

Isso se não houver mudanças na equipe econômica. O mercado já embutiu nos preços dos ativos algum tremor em função da possível saída de Palocci. Mas a crença à qual todos se agarram é a manutenção do rumo na política monetária.

¿ Se cair o Palocci, assume o Murilo Portugal ou o Joaquim Levy.Oproblema é o mercado achar quemuda a orientação econômica ¿ alerta Monteiro. ¿ É claro que todos já trabalhavam com a possibilidade de que a crise atingiria, eventualmente, o ministro ou até o presidente Lula. Era inevitável. São as mesmas pessoas trabalhando juntas há anos. Essa história de que ninguém sabia de nada não cola.

E se a crise inviabilizar a reeleição? ¿ O mercado gosta mais do PSDB do que do Lula light ¿ ironiza o estrategista da Fator.

No meio do caminho... O ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, e o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, têm encontro marcado nesta terça-feira, no seminário ''Viabilização dos investimentos nos setores de transportes rodoviários e energia elétrica'', promovido por empresários e parlamentares da Frente de Defesa da Infra-Estrutura Nacional. Em pauta, os R$ 2,3 bilhões de dotação orçamentária para investimentos em rodovias, ferrovias e hidrovias que correm o risco de não sair do papel até este ano, devido aos famigerados contingenciamentos.

...muitos buracos Enquanto a meta de aperto fiscal é superada com folgas, 75% da malha rodoviária apresentam asfalto em condições ruins ou péssimas e só oito mil quilômetros de rios, dos 42 mil com potencial de exploração, são usados para navegação de cabotagem.

A luta dos municípios O secretário municipal de Fazenda do Rio, Francisco Almeida e Silva, foi reeleito para um segundo mandato à frente da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf). É a primeira vez que um presidente da entidade é reconduzido. Suas principais batalhas serão a mudança na lei de partilha do ICMS entre estados e municípios e a defesa do ISS, mais importante fonte de tributos das capitais.