Título: Tranqüilidade ameaçada
Autor: Duilo Victor
Fonte: Jornal do Brasil, 21/08/2005, Rio, p. A23

Problemas de grandes cidades, como aumento do tráfico de drogas e crescimento da favelização, vêm impondo mudanças de comportamento a moradores de pólos do interior fluminense, que até bem pouco tempo conservavam hábitos como o de andar sozinhos à noite ou deixar a porta de casa destrancada. Apesar de ainda distantes dos números de criminalidade da capital, dados do Instituto de Segurança Pública acusam, por exemplo, que o número de homicídios dolosos e furtos na Região dos Lagos - liderados por Cabo Frio - ficaram acima da média do estado em junho. Em Nova Friburgo, Região Serrana, casos recentes de assassinatos na principal avenida da cidade contribuíram para a estatística de 51 homicídios registrados este ano na delegacia da cidade. Mais que os 36 notificados em todo o ano passado.

- Apesar de a maioria dos crimes estar associada ao tráfico, não era comum há poucos anos ocorrerem tantos assassinatos. Fora o Centro, onde ainda se pode andar a pé, o resto da cidade já tem que ser evitado à noite por causa do risco de assaltos - comenta Candido Ramadinha, contador de 53 anos, que sempre morou em Friburgo. Segundo ele, velhos costumes, como passar a noite conversando na maior praça pública do município, a Getúlio Vargas, não são mais recomendados.

Em Macaé, cidade com cerca de 150 mil habitantes e que vai dobrar a população nos próximos três anos por causa da prosperidade da indústria do petróleo, a prefeitura já tomou a iniciativa de instalar 20 câmeras para vigiar, com ajuda da Polícia Militar, as regiões mais movimentadas.

- Temos um batalhão de Polícia Militar para sete municípios, que também crescem com o petróleo. Acredito que o contingente de policiais está aquém da necessidade. A imagem da cidade como a de um eldorado do desenvolvimento tem atraído muita gente, muitos sem qualificação de mão-de-obra, causando um inchaço da periferia - explica o secretário de Governo de Macaé, André Braga.

A inspetora de Polícia Civil Marina Maggessi afirma que, se antes no interior a violência era dominada pelos crimes passionais, a maioria dos assassinatos ocorridos hoje é ligada ao tráfico de drogas.

- O tamanho de cidades como Friburgo e Macaé não permite mais que elas sejam chamadas de interior. Apesar de ainda não haver filiais do tráfico carioca instaladas nesses locais, o crescimento desordenado tem feito com que os crimes fiquem mais parecidos com os da capital. Em Itaboraí, por exemplo, existem três grandes favelas em que bandidos disputam entre si o tráfico de drogas. Mas a estrutura do tráfico no interior está há pelo menos 40 anos do que se encontra no Rio - observa a inspetora.

Chefe do Comando de Policiamento do Interior 1, o coronel José Alberto Marques reconhece que o patrulhamento no interior do estado deve aumentar, apesar de a média de homicídios na região ter mantido um patamar constante. Até o fim do ano, segundo Marques, 120 novos PMs divididos entre os batalhões de Friburgo, Barra do Piraí e Campos estarão nas ruas.

- O tráfico de drogas tem se desenvolvido no país inteiro, não só no Estado do Rio. Em épocas e áreas especiais, como no verão de Cabo Frio, a Polícia Militar pode deslocar contingentes de outros batalhões - responde.

Região com cerca de 475 mil pessoas, as cidades de Cabo Frio, Araruama, Búzios, Saquarema, Arraial do Cabo, Iguaba Grande e São Pedro d'Aldeia registraram 31 homicídios dolosos em junho. A média deste tipo de crime por 100 mil habitantes chegou a 6,52, enquanto no estado foi de 4,5. No mesmo levantamento, o número de furtos atingiu o índice de 87,87 por 100 mil moradores em junho. No estado a média foi de 68,7.

- Os homicídios em Cabo Frio ainda não obedecem uma lógica estatística. Em junho, foram 12 casos, mas, em julho, nenhum foi notificado. É o tráfico de drogas que preocupa, principalmente no verão, quando a cidade multiplica de tamanho com os turistas. Para as cidades do interior, o Rio é uma lição de que não se deve permitir o crescimento desordenado - afirma o delegado titular da 126ª DP (Cabo Frio), Jorge Luiz Veloso.

Delegado titular de Friburgo, Guerlan Morais responde que o aumento dos casos de homicídio este ano está relacionado em parte a pequenas quadrilhas da Região Metropolitana do Rio que fogem para cidade:

- A repressão aperta na capital e os bandidos vêm tomar os pontos de venda de drogas daqui. Apesar disso, o tráfico em Friburgo passa longe de ser como nas grandes cidades. Em três anos, nunca apreendi arma com calibre acima de 38.