Título: Dirceu corre para não ser cassado
Autor: Karla Correia e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 23/08/2005, País, p. A3

O deputado José Dirceu (PT-SP), em sua defesa apresentada ontem ao Conselho de Ética, alegou que não pode ser acusado de quebra de decoro parlamentar porque exercia o cargo de ministro de Estado durante o funcionamento do suposto esquema de mensalão denunciado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). A tese, contestada pela consultoria jurídica e por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consultados pelo Jornal do Brasil, é a linha-mestra da defesa apresentada pelo ex-chefe da Casa Civil. - Como os atos atribuídos ao representado teriam sido por ele praticados fora do exercício parlamentar, não podem caracterizar falta de decoro e, conseqüentemente, não estão abrangidos pelo juízo político do douto Conselho de Ética e Decoro da Câmara - pondera o advogado de Dirceu, José Luiz de Oliveira Lima.

Além de afirmar que não pode ser julgado pela Câmara, Dirceu também procurou desqualificar todas as acusações feitas por Roberto Jefferson. Na sua defesa, disse ser alvo de ''acusações delirantes'', que seriam ''frutos exclusivos de uma mente doentia'', a do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ).

O petista lembra que o petebista não apresentou a lista dos parlamentares favorecidos pelo suposto esquema de mensalão, nem tampouco quais trabalhos legislativos teriam tido o andamento regular prejudicado ou o seu resultado alterado em virtude do suposto pagamento de propina a deputados.

Em relação aos empréstimos contraídos pelo PT junto ao Banco do Brasil e ao BMG, Dirceu reforçou o argumento de que sabia das dificuldades financeiras enfrentadas pelo partido. Mas alegou que não teve qualquer envolvimento na contração dos empréstimos feitos com o aval de Marcos Valério Fernandes de Souza. Segundo ele, após trabalhar como coordenador da campanha de Lula em 2002, começou a atuar na montagem do governo petista e, posteriormente, exerceu o cargo de chefe da Casa Civil, perdendo qualquer vínculo de comando com o PT.

Dirceu, que apresentou como suas testemunhas de defesa o ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos e os deputados Eduardo Campos (PSB-PE), Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Aldo Rebelo (PCdoB-SP), além do jornalista Fernando Morais, bateu ainda na tecla de que não há qualquer indício contra ele nas acusações feitas por Jefferson.

A defesa espera que os quatro, que devem prestar depoimento público ao Conselho, avalizem a tese de Dirceu de inexistência de mensalão. Bastos teria o bônus de emprestar sua credibilidade pessoal, tida pelo governo como expressiva, a Dirceu.

Acrescentou que o relato das pessoas envolvidas no processo, inclusive Valério e sua mulher, Renilda Santiago, dão conta de que os recursos levantados serviram para acertos financeiros nas campanhas de aliados do PT. E que ninguém, diretamente, deu garantias que ele, Dirceu, soubesse dos empréstimos.

- As pessoas referidas pela representação se limitaram a dizer que tinham sido informadas por terceiros de que o deputado José Dirceu tinha conhecimento destes empréstimos - alegou o advogado, na peça de defesa de Dirceu apresentada no Conselho de Ética.

O relator do processo de cassação de Dirceu, deputado Júlio Delgado (PSB-MG), afirmou que o relatório tem que estar pronto para ser votado no plenário da Câmara até o dia 15 de novembro. Delgado confirmou que vai solicitar todos os depoimentos prestados por duas das testemunhas de acusação apresentadas por Roberto Jefferson - Marcos Valério e Renilda - nas CPIs que acontecem no Congresso (Mensalão e Correios), na Polícia Federal e Procuradoria Geral da República.

- As outras duas testemunhas serão ouvidas por nós: a diretora do Banco Rural, Kátia Rabelo e o diretor do BMG, Flávio Guimarães - acrescentou Delgado.

Para o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), a despeito de aparecerem outros Burattis - numa referência ao ex-assessor de Antonio Palocci, Rogério Buratti - quem vai ditar o ritmo e o rumo da crise política é José Dirceu.

- Ele não pode mais renunciar, o prazo já passou. Terá agora que decidir se morre sozinho ou se abre o jogo - afirmou o tucano.

O ex-ministro deve entrar com pedido de liminar no Supremo para sustar o processo, a menos que o Conselho aceite seu argumento e liminarmente suste o processo, hipótese muito remota.