Título: Cidades abertas ao turismo
Autor: Miguel Jorge*
Fonte: Jornal do Brasil, 24/08/2005, Outras Opiniões, p. A11

Para transformar as suas capitais em centros turísticos complementares, apesar das diferenças de temperamento, relações de trabalho e modo de vida e lazer, os prefeitos de São Paulo, José Serra, e do Rio de Janeiro, Cesar Maia, assinaram acordo que prevê pacotes turísticos mais baratos entre as cidades. Nos fins de semana, um casal paulistano poderá visitar o coração turístico e sentimental do país gastando apenas R$ 800, desconto de até 50% na passagem aérea, mesma quantia que gastaria outro casal carioca que quiser ir a São Paulo para conhecer de perto uma das maiores cidades do mundo.

Com isso, os prefeitos querem mostrar a seus munícipes que morar em São Paulo e vir ao Rio - ou vice-versa - os farão se sentir mais integrados ao Brasil. E que, se mais paulistanos ou cariocas não viajam entre as duas cidades, distantes só 400 km ou 35 minutos de avião uma da outra, perdem ambos, as economias dos seus municípios e a indústria do turismo. Se, ainda, servir mesmo para aproximar mais paulistanos e cariocas, sepultando briguinhas provincianas, sobretudo no esporte, o acordo poderá trazer ainda melhores resultados, entrosando uma das cidades mais bonitas do mundo à megalópole na qual a média das pessoas tem mais dinheiro para gastar.

Pelo acordo, o carioca que visitar São Paulo ou o paulistano que for ao Rio, num final de semana, poderá pagar a tarifa em prestações equivalentes - pois não se trata de promoção para as elites - ao valor de uma parcela de telefone celular, usando-se até cartão de crédito.

A expectativa das empresas estatais de turismo é a de que, nos primeiros dias, o Super Weekend atraia mais de 300 turistas de cada capital, fluxo que aumentaria aos poucos, mas na proporção da maior oferta de vôos, vagas em hotéis, transporte de massa, segurança pública, etc. A indústria hoteleira do Rio estima que, até o final do ano, a afluência de turistas entre as cidades cresça 20% (coincidência ou não, uma companhia aérea acaba de lançar programa pelo qual, com passagem, traslado e hospedagem, pode-se passar uma noite no Rio, em apartamento duplo, por R$ 389, pagos em prestações).

Mas o êxito do Super Weekend exigirá uma ação coordenada do setor público, dos empresários, e de outros segmentos envolvidos no ideal do turismo planejado - praias, gastronomia, teatros, parques, museus e badalação são importantes em cidades abertas ao turista, mas não servem para nada se elas não tiverem seus equipamentos preservados. Algo precisa ser feito nesse aspecto, para que o fluxo turístico entre as duas cidades crie raízes - e o único caminho para segurar os turistas paulistano e carioca, evitando que eles se dirijam a outros locais, é investimento público e privado. Só um exemplo: as praias de Copacabana e Ipanema - a ''princesinha do mar'' da música de Braguinha e o berço da canção de Tom Jobim, respectivamente -, não são hoje retratos muito bonitos da desordem urbana do Rio.

Em São Paulo, também há muito a ser feito pela Prefeitura, começando pelas áreas mais degradadas do centro velho da capital, inclusive as avenidas Ipiranga e São João, de cuja esquina falou o poeta e médico Paulo Vanzollini na canção popularizada pelo baiano Caetano Veloso. Porta de entrada da cidade, o aeroporto de Congonhas e suas proximidades são palco de assaltos a taxistas e furtos de passageiros - os próprios paulistanos, excetuando a classe rica, se declararam em recente pesquisa com uma percepção de qualidade de vida muito abaixo da média nacional. Nos sinais de trânsito, em 180 cruzamentos da capital, segundo estimativas da prefeitura, um exército de crianças, com frio e fome, movimenta negócios no montante de R$ 40 mil por ano, dos quais 90% vão para o bolso de aliciadores.

Para paulistanos e cariocas terem um Super Weekeend, convenhamos, São Paulo e Rio têm muito mais a oferecer que problemas desse tipo.

*Miguel Jorge é vice-presidente de Recursos Humanos e Assuntos Corporativos e Jurídicos do Santander Banespa.