Título: Perito denuncia tortura
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Fonte: Jornal do Brasil, 29/08/2005, País, p. A6
O perito responsável pela necropsia do corpo do prefeito assassinado de Santo André (SP), Celso Daniel (PT), afirmou em depoimento ao Ministério Público que o petista foi brutalmente torturado. Disse ainda que guardou silêncio porque foi ''censurado'' pela Polícia Civil paulista. A declaração do médico-legista Carlos Delmonte Printes, feita três anos e meio após a morte de Daniel, contraria a versão oficial apresentada pela polícia, que sustentou que o prefeito petista foi vítima de crime comum (seqüestro-relâmpago seguido de morte) sem prática de tortura.
- É excepcional a ocorrência de morte em casos de seqüestro-relâmpago. Com relação ao seqüestro convencional, nunca examinei um caso em que houvesse um ritual de tortura, com a crueldade e a desproporcionalidade que verifiquei no corpo de Celso Daniel - garantiu o perito.
Com 21 anos de profissão e autor do livro Perícia na tortura, Printes, à época do crime, dirigia o setor de Tanatologia do Instituto Médico-Legal de São Paulo. Após defender a versão de tortura, disse ter sido rebaixado do cargo, passando a cuidar da oficina de tafonomia (estudo de corpos em estado de putrefação).
A censura, disse ele, ocorreu após ter falado sobre os sinais de tortura em uma entrevista na TV. À Promotoria, Printes afirmou ter sido proibido de falar com jornalistas sobre o assunto.
Daniel foi seqüestrado na noite de 18 de janeiro de 2002. Ele estava em um carro guiado pelo ex-segurança e empresário Sérgio Gomes da Silva. Dois dias depois, o corpo foi encontrado com marcas de tiro. Gomes da Silva foi acusado pela Promotoria de ser o mandante.
Após analisar o corpo de Daniel, Printes estabeleceu uma ordem sobre o que ocorreu no período em que o prefeito ficou seqüestrado. Primeiro, o petista sofreu uma lesão próxima ao ouvido esquerdo - este ferimento pode ter sido causado na hora do seqüestro. Horas depois, Daniel teria sido queimado nas costas, provavelmente com o cano do revólver, e atingido por estilhaços de balas de uma arma disparada perto de seu corpo.
Depois, continua Printes, atiraram ao lado do rosto de Daniel, que tem marcas de ricochete de projéteis. Por fim, houve disparos no tórax e no abdome, num total de oito tiros.
O perito garantiu ter alertado a polícia sobre a incompatibilidade entre a reconstituição do crime e a lógica dos disparos. Afirmou que o menor acusado pela polícia de ser o autor dos disparos não poderia ter matado Daniel. ''O menor deve ter atirado em outra pessoa, não no prefeito'', revelou o perito, mas o alerta, segundo ele, foi ignorado.
Para o promotor Roberto Wider Filho, que investiga o crime, em seu depoimento, Printes garante que Daniel foi torturado.
- É a prova absoluta e pericial de que não foi crime comum. Foi um crime de ódio contra Celso Daniel - concluiu Roberto.