Título: Mudança de última hora
Autor: Paulo de Tarso Lyra e Renata Moura
Fonte: Jornal do Brasil, 30/08/2005, País, p. A3

A oposição passou ontem o dia em pânico diante da possibilidade do relatório do deputado Jairo Carneiro (PFL-BA), que pede a cassação de Roberto Jefferson (PTB-RJ), afirmar que ''ainda não existem provas da existência do esquema de mensalão''. O PFL colocou Jairo na parede e o relator prometeu mudar o voto, deixando em aberto a possibilidade da existência de um esquema de repasse de recursos ilegais do governo e do PT para os partidos da bancada governista - independentemente do nome que fosse dado a este procedimento.

Esses recursos repassados aos partidos aliados teriam origem dos atos de corrupção praticados na máquina federal e a sistemática de distribuição destas verbas ficaria a cargo de cada partido. Caso negassem a existência do mensalão, os deputados acusados de serem beneficiários do suposto esquema teriam argumentos para pedir a absolvição.

- A tese é de que mensalão é corrupção, independente do nome que ele venha a receber - confirmou um parlamentar da oposição.

PFL e PSDB temiam que a ausência do acréscimo verbal ao voto enfraquecesse as investigações e as punições dos demais suspeitos de envolvimento com o esquema de Marcos Valério Fernandes de Souza. No caso da representação contra o deputado José Dirceu (PT-SP), por exemplo, o texto fala de ''fraudes ao regular andamento das atividades legislativas, visando a alteração dos resultados das deliberações, o que configura atos incompatíveis com o decoro parlamentar''.

- Não podemos corroborar o argumento de Delúbio Soares de que tudo foi feito para saldar dívidas de campanha - desesperou-se um pefelista.

O líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP), chegou a ameaçar a apresentação de um relatório substitutivo ao de Carneiro, caso as ressalvas não fossem de fato feitas pelo pefelista. Apesar de não achar que a situação pudesse chegar a esse ponto, Goldman demonstrava preocupação no meio da tarde.

- Até acho difícil, neste momento, frisar que havia mensalão. Mas não podemos dizer que não existe. Não podemos enfraquecer o relatório - cobrou.

Depois de uma bateria de telefonemas de pefelistas e de duas reuniões a portas fechadas com o deputado ACM Neto (PFL-BA), integrante da CPI dos Correios, Carneiro foi convencido a redigir o adendo ao seu voto.

- Pode ter certeza de que vou fazer uma intervenção verbal forte. Ninguém vai se proteger debaixo de um guarda-chuva que não existe - prometeu por telefone ao líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ).

O presidente do Conselho de Ética da Câmara, deputado Ricardo Izar (PTB-SP), apressou-se em divulgar uma nota no meio da tarde buscando afastar os fantasmas de que haveria um acordão para salvar cabeças no Congresso. Segundo a nota, ''existem provas cabais, e não mero indícios, de que houve pagamentos e retiradas regulares de dinheiro, por parte de alguns parlamentares''.

- Algumas retiradas, foram, inclusive, cíclicas, sugerindo, agora sim, fortes indícios de que poderia efetivamente existir um esquema de pagamento sistemático a deputados da base aliada - defendeu Izar.

Jairo Carneiro tentou desvincular o processo de Jefferson de outros que porventura venham a tramitar no Conselho de Ética. Para o pefelista, não há porque generalizar as situações, pois, ''cada caso é um caso''. E que o fato de não conseguir provar as coisas não significa que elas não existam.

- No meu conceito, o mensalão, significando um pagamento periódico com o objetivo de que as pessoas votem com o governo, está mais do que claro - acrescentou Carneiro.