Título: Menos juros, mesmos problemas
Autor: Sabrina Lorenzi e Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 31/08/2005, Economia & Negócios, p. A23

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, minimizou ontem o impacto que a taxa básica de juros (Selic) tem sobre a economia. Segundo ele, a simples redução não resolverá os problemas do país.

- Não há solução fácil (para crescer). O mercado controla as taxas de juros, controla os preços em geral, não só do dinheiro. Portanto, não há solução mágica - afirmou, durante o 6º Seminário de Metas para a Inflação, organizado pelo BC.

A solução para crescer não deve começar pela taxa básica de juros, mas, segundo Meirelles, pelo aumento de exportações, redução da dívida/PIB e reformas microeconômicas. Meirelles defendeu também a manutenção do compromisso fiscal e a convergência da inflação para as metas.

Meirelles afirmou ainda que a indústria brasileira deverá crescer neste ano a uma das taxas ''mais elevadas do mundo''. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção industrial cresceu 6,7% nos últimos doze meses. No primeiro semestre, a taxa é de 5% (em relação a igual período do ano anterior).

- Dados da produção foram encorajadores. A produção cresceu acima de 1% em maio e 1,7% em junho e sinaliza taxas de produção anualizadas das mais elevadas do mundo - disse.

Meirelles evitou comentar os desdobramentos da alta do petróleo - que passou dos US$ 70 por barril de Brent ontem - bem como não repercutiu a quarta deflação apurada pelo IGP-M, também conhecida ontem.

- Vamos observar isso - afirmou, sucinto.

Em sua impopular tarefa de manter juros altos no combate à inflação, o BC recebeu o apoio do professor Kenneth Rogoff, de Harvard, um dos maiores especialistas em política monetária. Durante sua palestra, o economista transpareceu a percepção de que reduzir a taxa de juros não é tarefa trivial para o Brasil.

- Acho que estaria mais confortável no Fed (banco central americano), que lida com dinheiro mais fácil e baixas taxas, do que adminitrando a escolha brasileira - disse Rogoff, referindo-se ao que chamou de ''pacote ideal'', que prevê autonomia do Banco Central e medidas como redução da dívida pública.

Segundo o economista americano, os sete processos de reestruturação da dívida pelos quais passou o país e uma alta relação dívida/PIB reduzem a margem do Banco Central para reduzir a taxa básica de juros.

- Embora a relação dívida/PIB tenha melhorado no curto prazo, no horizonte mais distante ela ainda está alta demais, o que leva o país a pagar prêmios elevados no mercado financeiro. Além disso, a carga tributária já é muito alta em relação aos seus concorrentes. Isso faz crer que o Brasil levará mais tempo e energia do que os demais países para cortar a taxa de juros - avalia Rogoff. - Embora o governo Lula faça um robusto superávit primário, a dívida ainda é alta e gera preocupações com o futuro. E o Brasil ainda é muito vulnerável nesse sentido.

Rogoff admite que o comportamento dos juros no Brasil tem sido desapontador para muitos, mas reiterou que o país ainda possui uma inflação elevada e uma taxa de inadimplência também elevada, o que impede um corte mais ousado na Selic. Rogoff avalia também que a redução acentuada da taxa no curto prazo deverá ser freada devido à instabilidade que se forma no mercado externo. Na última semana, o presidente do Fed, Alan Greenspan, disse que a liquidez nos mercados emergentes tende a recuar.

Outro fator que conta pontos contra o Brasil nessa tarefa é o mercado de crédito, segundo ele, ainda pouco desenvolvido.

- Esse componente tem um efeito mais grave do que as altas taxas nominais - afirmou.