Título: O PT começa a se encarar
Autor: ANA MARIA TAHAN
Fonte: Jornal do Brasil, 01/09/2005, País, p. A2

A coordenadora da Comissão de Ética do PT, Lene Teixeira, apresentará o relatório sobre as denúncias envolvendo o ex-tesoureiro Delúbio Soares ao Diretório Nacional no sábado, em São Paulo. O texto protocolado ontem pede a expulsão do ex-dirigente do PT, aponta para gestão temerária do caixa partidário e ousadias nada legais do poder autoconferido, sem falar em outros quesitos mais graves. Delúbio acompanhará a leitura e, em seguida, terá direito a apresentar sua defesa. Cumpridas as regras da boa conduta partidária, os integrantes do comando nacional debaterão o mérito e definirão a punição, se é que chegarão a tanto, do filiado que está levando o partido ao divã e a contínuos colapsos políticos, um purgatório que seguirá até a convenção marcada para dia 18 e se estenderá muito além, com a sangria exposta nos palanques de 2006. Delúbio estará sozinho no banco dos réus petista. O ex-secretário-geral Sílvio Pereira evitou a execração interna com a despedida da legenda. Desistiu do escudo e do Land Rover. José Dirceu, o comandante-em-chefe do grupo nos cinco anos que antecederam a ascensão do PT ao Planalto, enfrenta as turbulências do Congresso e do partido sem recuos. Treinado em Cuba, exercita a arte da guerrilha e, até agora, venceu todos os embates depois de forçado a deixar a Casa Civil. Figura na relação João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara - rápido na ação de enterrar qualquer investigação sobre a mesada paga a deputados denunciada pelo Jornal do Brasil em 24 de setembro do ano passado. Professor Luizinho, ex-vereador em Santo André e ex-líder da bancada de deputados, João Magno, José Mentor, ex-relator da CPI do Banestado, Paulo Rocha, outro ex-líder, todos citados em meio a denúncias, investigações, saques e documentos das CPIs dos Correiros, do Mensalão e dos Bingos, fogem dos holofotes, passeiam por desvios dos tapetes verdes para evitar o confronto com eleitores irritados ou militantes indignados.

O ex-tesoureiro abre a temporada do PT no purgatório dos julgamentos internos. E o partido mergulha na própria lama, que criou e arrastou a credibilidade do presidente Lula e de estrelas que um dia dominaram a constelação da legenda. Pode sair do processo em franca recuperação externa ou atolar de vez no lodo se não souber julgar-se em cada votação dos destinos políticos e partidários daqueles que um dia ungiu ao comando.

Este é o sábado do confronto de uma legenda que cresceu em 25 anos enquanto se alimentou do sonho, da utopia, de idéias de sindicalistas, intelectuais, brasileiros de todos os credos que queriam mergulhar na Política para melhorar a política. Menos do que débitos a pagar pelo passado partidário de todos os josés, Dirceu incluso, delúbios, sílvios e quem mais for, tem uma imensa dívida consigo mesmo, com filiados e a massa anônima que se encaixa na definição de "simpatizantes".

Lene Teixeira, a coordenadora da Comissão de Ética, informa quem acompanhou, trabalhou duro no levantamento de informações e na apuração dos fatos imputados a Delúbio. Montou um relatório objetivo e pouco adjetivado. É econômica nas palavras. Confrontou-se com os fatos, ouviu, ponderou, recolheu provas. Ao ler o relatório, fará uma espécie de diário de atos e omissões dos poderosos da legenda até há pouco tempo. Aos integrantes do Diretório Nacional, muitos deles envolvidos no processo de disputa partidária pelo comando da legenda e com interesses e pecados também a purgar, caberá definir a punição a Delúbio. E, em sentido mais amplo, ao próprio partido. Se o PT sairá menor ou maior do fim de semana, está nas mãos de cada um deles.