Título: Fila das cassações começa a andar
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Fonte: Jornal do Brasil, 02/09/2005, País, p. A3
Oitenta e sete dias após ter denunciado o esquema de pagamento de mensalão a parlamentares, o Conselho de Ética da Câmara aprovou por unanimidade (14 votos a zero) o pedido de cassação do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). E a sessão que definiu o destino político do deputado refletiu fielmente como será a batalha para punir os envolvidos com o escândalo do mensalão. A sessão, que durou cinco horas, teve discursos políticos contundentes, brigas, troca de ofensas e abandono de plenário por parte dos advogados de Jefferson, alegando cerceamento de defesa. O voto aberto pesou contra o petebista e os 14 integrantes do Conselho analisaram que o parlamentar fluminense quebrou o decoro parlamentar ao aceitar R$ 4 milhões recebidos de forma irregular, praticar tráfico de influência e acusar colegas de receber o mensalão, sem apresentar as provas devidas.
- Graças a Deus, conseguimos. O processo segue para o plenário - comemorou, aliviado, o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PTB-SP).
Izar promete encaminhar o relatório ainda hoje para a Mesa Diretora da Câmara, que terá um prazo regimental de duas sessões para colocar a matéria em votação no plenário da Câmara. O pedido de cassação entra na pauta de votações da Câmara no dia 13 de setembro. Para que o petebista perca de fato o mandato, são necessários 257 votos, em votação secreta.
Mas a batalha ainda promete ser longa. Os advogados de Jefferson vão apresentar um mandado de segurança ao Supremo Tribunal Federal, alegando cerceamento de defesa. Quando o relatório e o voto do deputado Jairo Carneiro (PFL-BA) foram lidos na última segunda, eles já haviam reclamado de que novos fatos - o recebimento dos R$ 4 milhões, a inexistência de uma reunião do deputado José Múcio Monteiro (PTB-PE) com deputados do PP e do PL e a acusação de tráfico de influência - foram aditados ao processo, sem que um novo prazo de defesa fosse aberto. O advogado de Jefferson, Luiz Francisco Barbosa, voltou a classificar a decisão da CCJ da Câmara, corroborando o aditamento das denúncias, de fascista.
Os defensores de Jefferson perderam de vez a paciência quando o relator Jairo Carneiro apresentou um ''esclarecimento de voto''. Luiz Francisco e o segundo advogado, Itapuã Messias, queriam contradizer o relator. Pediram para acrescentar nos autos uma reportagem sobre o mensalão. O pedido foi negado, alegando que a medida não poderia acontecer porque a fase de instrução do processo já acabara. Revoltados, e sob vaias dos parlamentares, os dois advogados deixaram o plenário.
- A defesa se retira, é muito cerceamento em uma sessão apenas - disse Luiz Francisco.
O restante da sessão transcorreu de forma tranqüila, sem sustos, mas com surpresas. Um dos votos mais misteriosos e esperados era do deputado Josias Quintal (PMDB-RJ). Quintal vinha repetindo que as denúncias de Jefferson foram fundamentais para desvendar o ''maior esquema de corrupção da história do país''. Manteve a análise, mas resolveu votar a favor da cassação.
- Eu mantinha a expectativa de que ele apresentasse uma justificativa para os R$ 4 milhões recebidos do PT. Como isso não ocorreu, sinto-me no dever ético de acompanhar o relator - disse Josias Quintal.
A esquerda petista, que chorou no plenário há três semanas quando o publicitário Duda Mendonça reconheceu o caixa 2 nas campanhas do partido, votou coesa contra Jefferson.
- Ele descobriu o mensalão e só denunciou 22 meses depois. Isso é cumplicidade e conivência - acusou o deputado Chico Alencar (PT-RJ).
Horas depois, o relatório parcial das CPIs do Mensalão e dos Correios, que pede investigação contra Roberto Jefferson e mais 17 deputados acusados de envolvimento com o mensalão, também foi aprovado por unanimidade. Em sessenta páginas, o texto apontou indícios de quebra de decoro dos parlamentares e sustentou que o Conselho de Ética é o órgão apropriado para investigar os supostos desvios de conduta parlamentar.
O relatório conjunto das CPIs dos Correios e do Mensalão aponta, entre outras coisas, o deputado José Dirceu (PT-SP) como criador do esquema de compra de votos de parlamentares em troca de apoio ao governo.
O texto trouxe críticas às justificativas do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que afirmou que o partido teria recebido empréstimos de Marcos Valério para ajudar partidos da base aliada no financiamento de campanhas municipais.
- Para quem não se recusa a enxergar, surge claro como a luz do Sol, que essa singela justificativa não passa de uma desculpa esfarrapada, combinada entre Marcos Valério e Delúbio Soares - afirma o documento.