Título: STF tende a não interferir em cassação
Autor: Sergio Duran
Fonte: Jornal do Brasil, 05/09/2005, País, p. A3

A sucessão de processos de cassação de deputados acusados de envolvimento com o mensalão pode gerar também uma explosão de recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF). A começar por Roberto Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu (PT-SP), todos os parlamentares prometem reivindicar seus direitos na Justiça, alegando ''cerceamento de defesa''.

Recorrer ao Judiciário é um direito garantido a todos. Mas o STF tem doutrina firmada, no sentido de que a perda de mandatos de deputado ou senador, aprovada pelo plenário de uma das Casas por ''falta de decoro parlamentar'', é decisão ''discricionária'' e ''interna corporis'' do Legislativo, ou seja, relativa à própria instituição.

- Qualquer ato de ofensa ao decoro parlamentar culmina por atingir, injustamente, a própria respeitabilidade institucional do Poder Legislativo, residindo, nesse ponto, a legitimidade ético-jurídica do procedimento constitucional de cassação do mandato parlamentar - definiu o ministro do STF Celso de Mello, relator do acórdão do julgamento, pelo plenário, de um mandado de segurança do então deputado Pinheiro Landim (PMDB-CE), que acabou por renunciar ao seu mandato, no ano passado.

Outro processo famoso foi o que cassou o deputado Nobel Moura (PTB-RO), em 1992. Em uma semelhança com o momento atual, Moura foi cassado sob a acusação de ter recebido dinheiro para trocar de partido. Na época, o ministro Marco Aurélio, relator do acórdão, ressalvou que o processo de perda de mandato é ''regido por normas interna corporis'', sublinhando que é um processo político e não judicial.

Não se tem notícia, nos últimos anos, de liminares em mandados de segurança ajuizados por parlamentares em casos de perigo de perda do mandato, em razão de ''falta de decoro parlamentar'', que tenham sido deferidos pelos ministros-relatores, sem que os casos sejam analisados, no mérito, pelo plenário do STF. O ''periculum in mora'' (perigo de que a demora de uma decisão venha a prejudicar a parte que se sente prejudicada), nesses casos, viria exatamente a beneficiar o que se sente injustiçado. E o ''periculum in mora'' é condição essencial para a concessão de liminar em mandados de segurança ou habeas corpus.

Os advogados de Roberto Jefferson protocolaram na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, na noite de quinta, um recurso contra o relatório do deputado Jairo Carneiro (PFL-BA) pedindo a cassação do parlamentar fluminense. Ao recurso foi acrescido um voto em separado do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), alegando que Jefferson não teve direito a defesa plena.

O eixo central é o fato de que novas denúncias foram aditadas à acusação original. Além disso, os advogados apontam que não foram ouvidas todas as testemunhas de defesa arroladas por Jefferson. Uma destas testemunhas seria o secretário-geral do PP, Benedito Domingos (DF), que acusou o líder do partido na Câmara, deputado José Janene (PR), de distribuir o mensalão em seu apartamento, batizado de pensão.

- Não há como alegar cerceamento de defesa neste caso. Nós convidamos Benedito 16 vezes, ele não veio. O Conselho não é como CPI, não pode convocar - justificou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR).

Integrante da CPI dos Correios e da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) não acredita que o STF vá alterar as decisões tomadas pela Câmara. Mas lembra que qualquer cidadão tem a liberdade de recorrer à Justiça quando se sentir tolhido em seus direitos.

- O Judiciário também tem autonomia e liberdade para tomar suas decisões. Mas não vejo muito espaço para reversão de resultados - acredita o pefelista.

Também integrante da CPI dos Correios e uma das referências nos debates jurídicos da Comissão, a deputada Denise Frossard (PPS-RJ) lembra que o processo democrático brasileiro ainda está sujeito a essas oscilações, classificadas por ela de check and balance. Por conta disso, decisões de um poder sempre serão contestadas em outra instância. Apesar de concordar que recursos ao Judiciário não são um sinal de instabilidade institucional, ela acredita que, com o passar do tempo e o amadurecimento das instituições, estas contestações serão cada vez menos freqüentes.

A deputada, contudo, faz uma ressalva nos recursos dos parlamentares sob degola junto ao STF.

- Eles só poderão contestar a forma, jamais o conteúdo do processo de

cassação - ensina.

O presidente da CCJ, Antônio Carlos Biscaia (RJ), prometeu que todos os recursos encaminhados à Comissão serão julgados com a maior celeridade possível, mas reforçou a tese de que o julgamento é político, não jurídico.

- O legislativo tem que cumprir o seu papel e fazer o que a sociedade está exigindo - cobrou o petista.