O Estado de S. Paulo, n. 46643, 01/07/2021. Internacional, p. A14

Jovens tomam vacina sem os pais saberem



Adolescentes escondem várias coisas dos pais. Bebedeiras, sexo, notas baixas. Mas o segredo que Elizabeth, uma nova-iorquina de 17 anos, esconde dos pais é novidade no cardápio de transgressões juvenis. Ela não quer que os pais saibam que ela foi vacinada contra a covid-19.

Divorciados, os pais de Elizabeth têm direitos iguais a respeito dos cuidados com sua saúde. Apesar de a mãe ser fortemente favorável à vacinação, o pai se opõe furiosamente – e ameaçou processar a mãe se Elizabeth for vacinada. A jovem não esconde o segredo somente do pai, esconde também da mãe, para que ela possa contar com negação plausível.

A vacinação de jovens é crucial para que a sociedade atinja uma imunidade abrangente contra o coronavírus e isso possibilite o retorno a rotinas normais. Mas, apesar de vacinas contra covid estarem autorizadas para adolescentes a partir de 12 anos, muitos pais, preocupados com efeitos colaterais, resolveram não permitir que seus filhos as tomem.

Uma pesquisa recente da Kaiser Family Foundation descobriu que somente 3 em cada 10 pais de adolescentes com idades entre 12 e 17 anos pretendem permitir que eles sejam imunizados agora. Muitos dizem que aguardarão dados de segurança no longo prazo ou que autoridades de educação obriguem a vacinação de alunos. Mas com muitos adolescentes ávidos pelas vacinas, que consideram uma maneira de reconquistar liberdades retiradas durante a pandemia, tensões explodem em lares em que os pais insistem em dizer não.

Quarenta Estados exigem autorização dos pais para vacinar menores de 18 anos. Agora, por causa da pandemia, muitos Estados buscam relaxar essas regras de consentimento, elaborando estatutos similares aos que permitem a menores se vacinar contra HPV, o que previne certos cânceres causados por um vírus transmissível sexualmente. Mas alguns Estados caminham na direção oposta.

A discussão a respeito de quem tem poder de autorizar vacinações contra covid está renovando antigas questões legais, éticas e médicas. Quando os pais discordam entre si, quem arbitra? A partir de que idade crianças são capazes de fazer as próprias escolhas em relação à sua saúde e como isso deve ser determinado?

"A Isabella quer se vacinar porque os amigos estão se vacinando, e ela não quer usar máscara", afirmou Charisse, mãe de uma adolescente de 17 anos de Delray Beach, Flórida, que pediu para ter o sobrenome omitido. Charisse teme que a vacina prejudique o sistema reprodutivo da filha (uma desinformação que autoridades de saúde têm refutado). "A Isabella disse, 'O corpo é meu'. E eu disse. 'Bem, esse corpo me pertence até você fazer 18 anos'."

Adolescentes cada vez mais frustrados estão buscando maneiras de serem vacinados sem o consentimento dos pais. Alguns encontraram ajuda no Vaxteen.org, um site com informações a respeito de vacinas administrado por Kelly Danielpour, uma adolescente de Los Angeles.

O site contém orientações a respeito de leis estaduais a respeito da necessidade de consentimento para cuidar da própria saúde, links para clínicas, informações verdadeiras sobre a covid-19 e conselhos para adolescentes sobre como conversar com os pais. Ela inaugurou o site antes da covid. Filha de pais que atuam nas áreas de neurocirurgia pediátrica e direito intelectual, Kelly, de 18 anos, se deu conta de que a maioria dos adolescentes não conhece nem o calendário recomendado de vacinação. "Quero que os adolescentes sejam capazes de dizer aos pediatras, 'Olha, eu tenho esse direito'", afirmou Kelly, que dá palestras a conferências de médicos e autoridades de saúde. / NYT, Tradução de Augusto Calil

Direitos

"Quero que os adolescentes sejam capazes de dizer aos pediatras: 'Olha, eu tenho esse direito'"

Kelly Danielpour

Jovem que criou site com série de orientações