Título: PP tenta justificar saques nas contas de Valério
Autor: Paulo de Tarso Lyra e Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 03/09/2005, País, p. A4

Os deputados Pedro Corrêa e José Janene, acusados de envolvimento com o mensalão, montaram uma operação para justificar os saques de R$ 1,1 milhão das contas de Marcos Valério Fernandes de Souza, feitas pelo chefe de gabinete João Cláudio Genú. Pela tese, os recursos seriam utilizados no pagamento dos serviços de advocacia, destinado a defender Ronivon Santiago (PP-AC) e Narciso Mendes (PP-AC). Integrantes da Executiva, contudo, acusam a direção partidária de criar um serviço inexistente para justificar os saques e escapar do processo de cassação. Dois anos depois do suposto serviço de advocacia, os recursos ainda não foram contabilizados oficialmente na legenda. Para legalizar a tese, um funcionário do partido tentou descontar ontem um cheque assinado por Corrêa no valor de R$ 396 mil das contas do partido na agência da Caixa Econômica do Senado. O montante coincide com a dívida com a Receita Federal, pela ausência de declaração do serviço em 2003. A estratégia, contudo, deu errado: como o cheque não tinha assinatura do tesoureiro do PP, deputado Leodegar Tiscoski (SC), a operação foi abortada.

Segundo um parlamentar do PP de São Paulo, a operação, engendrada pela cúpula do partido aliada a Janene, ganharia contornos ainda mais suspeitos. Depois de saldar a suposta dívida com o Fisco, iriam apontar o advogado e ex-deputado Valmor Javarina como responsável pela defesa de Ronivon Santiago. Detalhe: Javarina não teria como desmentir o fato. Ele faleceu recentemente, vítima de câncer na garganta.

- Essa gente está passando dos limites. Estão usando até pessoa morta para legitimar uma operação completamente ilegal - afirmou o parlamentar que diz brigar no partido para expulsar ''a turma do Janene''.

A estratégia não é nova. Em depoimento na Polícia Federal (PF), o assessor da liderança do PP, João Claudio Genu, confirmou que retirava, do Banco Rural, dinheiro de empresas de Marcos Valério de Souza a pedido do líder do PP na Câmara, o deputado José Janene (PR). O dinheiro, segundo ele, era entregue para uma pessoa chamada Barbosa, contador do partido que também já havia falecido.

A briga promete ser longa. Na quarta-feira, um dia depois do presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PP-PE) ter endossado a tese do serviço de advocacia em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, foi marcada uma reunião da Executiva do partido. O boato que corria entre os parlamentares era de que o encontro serviria justamente para discutir no partido o pagamento do Imposto de Renda (IR) e da multa por sonegação fiscal. A reunião, no entanto, foi desmarcada meia horas antes de começar.

- Jamais houve qualquer reunião da Executiva do PP para discutir esse assunto - afirmou o terceiro vice-presidente do PP, deputado Ricardo Barros (PR).

O secretário-geral e ex-tesoureiro do partido, Benedito Domingos, também convidado para a reunião, confirma que o dinheiro para pagamento de honorários advocatícios nunca passou pela contabilidade oficial do PP.

- Esse dinheiro de que eles estão falando, se existe, nunca veio legalmente para o partido. Não tenho conhecimento sobre quem recebeu, quem pagou ou deixou de pagar - afirmou Benedito Domingos.

O ex-tesoureiro do PP lembrou que não haveria necessidade de contratar um novo advogado uma vez que o partido paga R$ 30 mil por mês ao escritório de advocacia Dr. Ferrão pelo mesmo serviço.