O Estado de S. Paulo, n. 46646, 04/07/2021. Metrópole, p. A15

Secretário prevê para setembro volta obrigatória

Entrevista: Rosslell Soares, Secretário da Educação do Estado de São Paulo


As próximas avaliações nacionais de educação serão "um desastre", com especial prejuízo aos alunos da rede pública, na avaliação do secretário da Educação, Rossieli Soares. "Nem sabemos se temos um conceito para baixo do porão do poço", diz, sobre a situação atual.

O secretário estadual da Educação, Rossieli Soares, comprou a briga da escola aberta. Durante toda a pandemia, tem sido a voz que mais defende o retorno presencial, até nas fases críticas. No entanto, mesmo com a rede paulista funcionando, os alunos não voltaram em massa. Ao Estadão, Rossieli fala das perdas na aprendizagem – principalmente no ensino médio –, do temor de grande abandono neste semestre e de uma recuperação que terá de deixar de lado o currículo.

"Ao invés de dar conteúdo novo, vamos dar revisão, conteúdos anteriores, de nivelamento. Esquece esse negócio todo aqui do currículo. É lindo, bonito, mas precisamos dar uns passos para trás para voltar a caminhar." Ele ainda deixa claro que pretende tornar obrigatória a presença dos alunos na escola em setembro, quando todos os adultos já terão tomado a primeira dose da vacina anticovid.

Por que poucos alunos têm voltado ao presencial na rede estadual?

São muitas razões e uma delas é que já houve diversas "voltas às aulas". Quando a gente começou, em 8 de setembro (de 2020), sabia que seria algo crescente, e assim foi, até o final do ano. Tivemos um bom desempenho até fevereiro e aí veio essa nova onda. Esse tanto de casos (de covid) atrapalha muito. Porque você quebra o elo de confiança com a família, ela começa a pensar "não vou mandar agora". Há também mentira, fake news, erro. E meias verdades, como um professor que pegou covid. Mas pegou dentro da escola ou porque foi ao restaurante, praia, supermercado? Teve também a questão de emprego, a crise financeira das famílias. O menino fazendo aula a distância de um jeito ou de outro e a família acha: 'Meu filho está avançando, tendo algo. E ele está me ajudando aqui porque cuida do filho mais novo'.

Muitos alunos até deixaram de abandonar a escola por isso.

Sem dúvida, é só pegar os dados do Estado. Tivemos a menor taxa de abandono da história em 2020, o pior ano da educação. Por quê? Porque a gente teve todo um trabalho pra manter o vínculo com o estudante. Sabe quando é que é que vai dar, realmente, o tamanho do problema? Quando a gente disser: é obrigatório voltar para a escola agora. Vamos lá, já vamos ter vacinado, talvez em setembro. Quando chegar a esse momento, o jovem vai ter de escolher entre ajudar a família a botar o que comer em casa ou voltar à escola. Esse vai ser o maior desafio.

Qual o momento de exigir a volta presencial obrigatória?

É fundamental que a gente construa esse caminho. Se disser que é obrigado de repente, vai acabar forçando o abandono da escola. A previsão é em 15 de setembro ter vacinado todo mundo acima dos 18 anos com a primeira dose. A primeira dose é muito eficaz, já vai ter um nível de proteção mais alto. Aí é o momento de cravar que é hora de voltar.

O aluno que está no ensino online está aprendendo?

Está. Todo o esforço que está sendo feito, seja pelo Centro de Mídias aqui em São Paulo, pelo professor, trabalho no WhatsApp, sinal de fumaça... O professor está correndo atrás. Mas ele não está aprendendo o que aprenderia na escola, é preciso deixar claro. Isso está mantendo o vínculo com o aluno e com o processo de aprendizado. Mas o presencial realmente nunca será substituído na educação básica.

Nas escolas particulares, a volta presencial chega a 100%...

Isso é o aumento da desigualdade na veia. O discurso de não voltar está prejudicando o aluno da rede pública, o que mais precisa. Acho que as próximas avaliações nacionais vão ser um desastre, vai ficar muito claro o tamanho do buraco. Precisaremos ensinar dois, três anos dentro de um ano para começar a recuperar.

Quando o senhor era ministro da Educação, em 2018, disse que o Brasil estava no fundo do poço em matéria de ensino. E agora, onde estamos?

Nem sabemos se temos um conceito para baixo do porão do poço agora. Mas é importante lembrar: estamos falando de uma geração da qual precisamos cuidar, que vai ter muitas dificuldades. A maior delas ainda é para o aluno que fez o 2.º ano do ensino médio no ano passado e está no 3.º ano. Talvez eu só tenha três, quatro meses pra apoiar esse menino. É difícil a situação, tenho certeza de que a perda vai estar muito mais clara no futuro desses jovens, por não terem tido acesso ao ensino médio como deveriam./