O Globo, n. 32758, 15/04/2023. Economia, p. 13

Dívida da União com precatórios já chega a R$ 141,7 bilhões

Renan Monteiro


O governo Lula herdou uma dívida de R$ 141,7 bilhões com precatórios, conforme dados atualizados pelo Tesouro Nacional, com levantamento até dezembro de 2022. A notícia foi antecipada pelo Valor. Foi um aumento de 41,3% em relação a 2021, quando eram R$ 101 bilhões.

Com esses dados, há risco de impacto negativo no Orçamento de 2023 e de comprometimento das metas exigidas pela nova âncora fiscal apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Os chamados precatórios são dívidas que precisam ser pagas pelo Estado após determinação judicial e quando não cabe mais recurso. Um dos exemplos mais comuns é o do servidor público que processa o governo pelo não pagamento devido de salários ou benefícios. Quando não se tem mais recurso judicial, a dívida é obrigatoriamente anexada ao Orçamento público.

“A variação dessa rubrica (dados até dezembro de 2022) se deve especialmente ao antigo Ministério da Economia, que apresentou adições líquidas de R$ 46,3 bilhões no estoque, variando de R$ 26 bilhões em 2021 para R$ 72,3 bilhões em 2022. O maior aumento proporcional ocorreu na rubrica Precatórios de Terceiros, que contabiliza todos os precatórios que não são de pessoal nem de benefícios previdenciários”, diz a Fazenda, em nota.

Com a PEC dos Precatórios, promulgada no fim de 2021, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro limitou o montante a ser desembolsado para cumprir decisões judiciais sem possibilidade de recurso. O movimento foi justificado pelo governo, na época, para garantir o pagamento do Auxílio Brasil (agora Bolsa Família).

— Houve gastos que aconteceram por conta da pandemia em 2020. Quando chegou em 2021, o governo estava em uma situação de ajuste de contas e demorou para a economia se recuperar. Já em 2022, ano eleitoral, o governo usou a manobra da PEC dos Precatórios e deixou de pagar R$ 22 bilhões em precatórios — relembra Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.

Grau de investimento

Eduarda Bolze, tributarista do SGL Advogados, explica que o movimento do governo passado levou a um aumento do estoque da dívida:

— Se o valor para pagar precatórios ultrapassar o limite previsto na PEC, as dívidas vão passando para o ano seguinte.

Agostini destaca que, antes de 2021, não havia atrasos significativos nos pagamentos. As dívidas julgadas em determinado ano já entravam no Orçamento do ano seguinte para pagamento. Para ele, a “manobra com os precatórios” foi realizada pelo governo Bolsonaro na tentativa de reeleição e na ânsia por mais gastos:

— Nós, como agência de classificação de risco, enxergamos essa situação com bastante preocupação, porque isso interfere no equilíbrio das contas públicas. Na apresentação do arcabouço, foi colocado que um dos objetivos era o Brasil voltar rapidamente a ser classificado com grau de investimento. Com esse processo em relação aos precatórios, não vemos a possibilidade de o país atingir esse selo tão cedo.

Para Riezo Almeida, professor de economia do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) e especialista em Gestão Pública e Financeira, o risco dos precatórios atrasados é criar “uma bola de neve”, já que há pagamento de juros e correções monetárias pelo governo. A tendência seria de aumento das dívidas, na medida em que não são pagas:

— Com a Selic (taxa básica de juros) a 13,75%, a tendência é haver um aumento próximo a 70% da dívida atual no ano que vem.