O Estado de São Paulo, n. 46664, 22/07/2021. Política p.A10

 

'Não sabia. Estou em choque', diz Ramos

 

General afirma, no entanto, que sabe que trocas no primeiro escalão do governo ocorrem 'por motivos políticos': 'É assim que funciona'

Eliane Cantanhêde

 

Apesar de ter conversado com o presidente Jair Bolsonaro um bom tempo na tarde de segunda-feira, quando ele voltou ao Palácio do Planalto depois da internação em São Paulo, o general da reserva Luiz Eduardo Ramos não fazia a menor ideia de que seria demitido da Casa Civil dois dias depois. "Eu não sabia, estou em choque. Fui atropelado por um trem, mas passo bem", disse o general ao Estadão, tentando demonstrar bom humor.

Segundo Ramos, que é considerado um dos mais leais colaboradores e amigos de Bolsonaro, o presidente já comunicou a ele a sua substituição pelo senador Ciro Nogueira (Progressistas-pi), ontem, mas não confirmou nada sobre sua eventual ida para a Secretaria-geral da Presidência, no lugar do ministro Onyx Lorenzoni, como a imprensa noticiava. "O presidente é ele, eu sou soldado, cumpro missão. Aprendi, em 47 anos de vida militar, que soldado não escolhe missão. Se ele me der outra no governo, eu aceito", antecipou o general, que manifestou o desejo de permanecer com gabinete no Planalto.

Ele tem uma situação particularmente delicada no governo: general de quatro estrelas, topo da carreira militar, ele abriu mão de um ano e seis meses no Exército, desistiu do sonho de ser comandante do Leste, no Rio de Janeiro, e passou para a reserva exatamente para um cargo relevante no governo do velho amigo Bolsonaro. Isso agora está em risco.

 

'Solidariedade'. Só uma coisa Ramos não admite: que façam "fofoca" ou publiquem que ele está caindo por incompetência ou por ter inimigos e sofrer pressões no Congresso. "Isso, não. Eu estava, aliás, ainda estou muito feliz na Casa Civil e dei o melhor de mim. Tanto que estou recebendo telefonemas de parlamentares de vários partidos, em solidariedade", disse.

Então, por que a troca? A resposta do general é direta: "Por motivos políticos, óbvio. Se eu estivesse sendo trocado por alguém formado em Oxford, ou Harvard, tudo bem, poderiam dizer que falhei. Mas é por um político aliado do presidente, é assim que funciona".

Realmente, o general Ramos, que foi secretário de Governo e assumiu a Casa Civil em março deste ano, está sendo substituído por Ciro Nogueira, presidente nacional do Progressistas e um dos principais líderes do Centrão, que, aliás, votou ostensivamente a favor do petista Fernando Haddad e contra Jair Bolsonaro em 2018.