Título: Política amarra crescimento
Autor: Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 07/09/2005, Economia & Negócios, p. A17
A crise política tem data marcada para afetar o desempenho da economia: o terceiro trimestre. Segundo projeção do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o crescimento no período ficará em 0,8% ante o trimestre anterior, abaixo do previsto anteriormente (0,9%). Segundo o economista Fábio Giambiagi, do Grupo de Conjuntura do Ipea, embora o efeito seja limitado, não se pode negar que houve influência das denúncias no campo político sobre os empresários. - Estimamos que os efeitos da crise política sejam limitados e concentrados no terceiro trimestre do ano. Os indicadores mostram que a crise ocorre basicamente no fim de junho e é claro que gerou algum efeito de ''parar para ver'' em alguns setores onde a tensão política influencia as decisões. Mas o efeito tende a ser superado com o passar do tempo para voltar a um patamar de 1% no quarto trimestre - disse.
De acordo com ele, indicadores de atividade de julho e agosto já apontam para uma desaceleração no período. A produção industrial de julho, que será divulgada amanhã, deve registrar queda, segundo o economista, de 0,5% a 1% ante junho.
Mas o Ipea está longe de ser pessimista. Para o ano, o instituto reviu para cima a taxa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB), de 2,8% para os 3,5% projetados ainda no primeiro trimestre. Na semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou crescimento de 1,4% do PIB no segundo trimestre, acima da previsão do Ipea (0,7%).
- Naturalmente, estamos adaptando nossas estimativas ao resultado do segundo trimestre, que veio melhor do que imaginávamos - disse Giambiagi.
A participação do setor externo - via exportações - na economia explica o avanço da projeção. Na composição do resultado previsto para 2005, as exportações contribuíam negativamente com 0,5 ponto percentual na projeção de junho. O desempenho revelado pela balança comercial, no entanto, reverteu a participação das vendas externas para o campo positivo em 0,2 ponto percentual nesse boletim. A demanda doméstica ficou inalterada entre setembro e junho, aos 3,3 pontos percentuais.
- O que explica a mudança na projeção do PIB é especificamente a demanda externa, seja por meio de um crescimento maior das exportações, seja por uma expansão menor das importações - disse Giambiagi.
A alta dos preços dos bens exportados - tanto dos manufaturados quanto dos básicos - explica em parte o bom desempenho das vendas externas. Para o Ipea, as exportações vão ficar 11% acima do ano passado. A previsão de junho era de que o crescimento nas vendas externas fosse parar nos 9,4%.
O baixo nível de compras no exterior fez o Ipea novamente rever para baixo o crescimento das importações. Em março, a estimativa de crescimento das compras externas neste ano era de 18,9%. Em junho, caiu para 16,6% e, agora, para 13,3%.
- A tendência, como qualquer país em desenvolvimento, é que o Brasil tenha um ligeiro déficit na balança comercial no futuro. Em 2007, é possível que tenhamos alguma correção, depois do forte ajuste externo feito nos últimos anos - avalia Giambiagi.
A projeção para 2006 também foi corrigida para cima, de 3,5% há três meses para 4% agora. Embora estime um crescimento maior no ano que vem, Giambiagi admite que a análise está sendo feita com ''uma margem de incerteza maior do que a habitual''.
- Se já é difícil adivinhar o futuro, em circunstâncias em que se requer competências que vão além das nossas, é mais difícil ainda - reconhece o economista.
Um indicador que, segundo o Ipea, aponta cenário positivo para o ano que vem é a recomposição do rendimento real (descontada a inflação) sobre os salários. A inflação em queda, já verificada nos últimos meses, tende a elevar o poder de compra do trabalhador.
- Observando-se os núcleos da inflação, que giravam em torno de 0,6% e caíram para 0,15%, percebe-se que, no terceiro trimestre, o BC teve êxito e quebrou a espinha da inércia inflacionária - avalia Giambiagi.
O Ipea revisou para baixo a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2005, de 6,3% para 5,3%. A meta fixada para este ano é de 5,1%. Para o ano que vem, a projeção da inflação é de 4,8%.
- A inflação só não convergirá para o centro da meta caso haja aumento nos derivados do petróleo. Se não, o resultado pode até ficar abaixo do esperado - aposta o economista.