O Estado de São Paulo, n. 46675, 02/08/2021. Política p.A5

 

Bolsonaro ameaça eleições em atos pró-voto impresso

 

A base mais fiel do presidente Jair Bolsonaro voltou às ruas ontem, em atos em Brasília e em pelo menos 20 capitais em defesa do voto impresso nas eleições de 2022. Mesmo após sucessivas e frustradas tentativas do chefe do Executivo de acusar fraudes no atual sistema eleitoral, que culminaram em uma live de duas horas com falas baseadas em fake news e análises enviesadas, bolsonaristas buscaram mostrar apoio à pauta – que já é considerada “enterrada” no Congresso – com manifestações pelo País.

Bolsonaro não compareceu fisicamente aos atos, mas participou por telefone, em mensagens transmitidas pelo sistema de som. Em suas redes sociais, o presidente divulgou vídeo de uma das falas, reproduzidas nas manifestações em Brasília, São Paulo, Rio e Belo Horizonte. Na capital federal, ele voltou a repetir a ameaça de que “não haverá eleição” se as disputas não forem “limpas e democráticas”.

Houve atos pró-governo também em Vitória, Salvador, Recife, Maceió, Fortaleza, João Pessoa, Natal, Manaus, São Luís, Belém, Boa Vista, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Cuiabá, Campo Grande e Goiânia.

Na Avenida Paulista, em São Paulo, a maior parte dos manifestantes se concentrou entre a Fiesp e o Masp. Além da defesa do voto impresso em 2022, houve críticas ao Supremo Tribunal Federal, ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB). “Por que não?” foi o mote da manifestação.

De acordo com os participantes, a possibilidade de imprimir o voto daria mais “transparência” ao processo eleitoral. Bolsonaro, na mensagem transmitida, afirmou que “uma eleição limpa, com voto impresso e contagem pública, é a garantia da democracia”.

Diversas pessoas não usavam máscaras, apesar da pandemia. Participaram do ato na Paulista os deputados dos PSL Eduardo Bolsonaro e Carla Zambelli e o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. “Não vamos aceitar eleição fraudada”, afirmou Eduardo ao discursar.

No ato em Brasília, manifestantes se reuniram na Esplanada dos Ministérios. Os organizadores levaram três carros de som. Participaram da manifestação o ex-chanceler Ernesto Araújo, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, e a deputada Bia Kicis (PSL-DF), autora da PEC do voto impresso, em tramitação na Câmara.

Segundo Bolsonaro, na mensagem aos apoiadores, “quem fala que a eleição é auditada é mentiroso”. Afirmou, ainda, que “algumas pessoas querem a volta daqueles que saquearam o País há pouco tempo”. Ele, no entanto, não citou nomes.

No Rio, apoiadores do presidente se reuniram em Copacabana. Manifestantes vestidos com camisa da Seleção Brasileira, alguns com bandeiras do Brasil e muitos sem máscara, carregavam cartazes pedindo o voto impresso e criticando o STF.

 

Bandeira. Em Porto Alegre, apoiadores e críticos do governo se encontraram e houve início de confusão. A Brigada Militar jogou bombas de gás lacrimogêneo para dispersar os grupos. Na capital gaúcha, um manifestante pró-governo carregava a Bandeira de Gadsden, um símbolo de supremacistas brancos dos Estados Unidos.

A mobilização em Belo Horizonte reuniu cerca de 1.500 pessoas, segundo a Guarda Municipal. Os manifestantes se concentraram na Praça da Liberdade. Vestidos de verde e amarelo e com bandeiras do Brasil, eles gritaram palavras de ordem contra a urna eletrônica e pediam a auditoria das eleições de 2022.

 

Mobilizações. As manifestações de ontem pelo ocorreram após a sequência de protestos de esquerda e centrais sindicais contra Bolsonaro – a mobilização mais recente pelo impeachment do chefe do Executivo ocorreu na semana passada.

Do lado favorável ao governo, os atos mais frequentes têm sido as “motociatas”, passeios com motociclistas liderados pelo presidente da República. A última aconteceu anteontem em Presidente Prudente, no interior de São Paulo. Em discurso no ato de anteontem, Bolsonaro voltou a defender mudanças no sistema eleitoral e disse que não aceitará “farsa” no pleito do ano que vem.

A ideia do voto impresso é uma bandeira do bolsonarismo que está materializada na PEC 135/2019, de autoria de Bia Kicis. A proposta está em comissão especial da Câmara. A tendência é de que a proposta não seja aprovada. O próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-al), disse que o voto impresso não tem apoio para chegar ao plenário da Casa. A afirmação foi feita um dia após Bolsonaro defender, em live, mudança no sistema de urna eletrônica, apesar de admitir não ter provas de fraudes.

Recentemente, Bolsonaro subiu o tom em defesa do voto impresso e chegou a atacar o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, chamando-o de “imbecil”. Como revelou o Estadão, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, mandou um recado a Lira, por meio de um interlocutor político, em que condicionava as eleições de 2022 à adoção do voto impresso./ / FABRÍCIO DE CASTRO, MATHEUS LARA, BRENDA ZACHARIAS, BRUNO VILLAS BÔAS, CÁSSIA MIRANDA, DIDA SAMPAIO E LEVY TELES E ALINE RESKALLA, EDUARDO AMARAL E JULIO CESAR LIMA, ESPECIAIS PARA O ESTADÃO