O Estado de São Paulo, n. 46676, 03/08/2021. Economia p.B1

 

Governo quer priorizar precatório de até R$ 66 mil e parcelar restante em 10 anos

Adriana Fernandes

Idiana Tomazelli 

 

Na proposta para mudar o pagamento dos precatórios (valores devidos a empresas e pessoas físicas após sentença definitiva na Justiça), o governo quer alterara regra para honrar de imediato apenas os pagamentos de até R $66 mil, quere presentam mais de 80% das sentenças devidas pela União, segundo apurou o ‘Estadão’ com fontes que participam das negociações. Segundo uma fonte da área econômica, esses credores continuarão recebendo o dinheiro “na bucha”.

Essas mudanças deverão ser incluídas em Proposta de Emenda Constitucional (PEC) em elaboração pelo governo para conseguir o apoio no Congresso. A proposta nem saiu do Executivo e já enfrenta resistência entre parlamentares e no mercado financeiro.

Para precatórios acima daquele valor, haverá um regime especial de parcelamento em dez anos, mas a duração é distinta: entre R $66 mil ( dez salários mínimos) e R $66 milhões, a regra será transitória e valerá até 2029; para os débitos superiores a R $66 milhões( o equivalente a mil vezes o salário mínimo ), are grade pagamento em prestações será permanente.

A regra transitória será acionada sempre que o valor global orçado para precatórios ultrapassar uma proporção da receita corrente líquida, que ainda está sendo definida e pode ficarem 5%. para isso, serão parcelados os precatórios do maior ao menor valor, até que o gasto esteja enquadrado no limite.

A ideia do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, era encaminhar o texto ontem ao Congresso, com a narrativa de que a aprovação do texto seria fundamental para garantir um aumento do programa Bolsa Família para valores acima de R$ 300 e até próximo de R$ 400. Mas a estratégia deu errado e o governo teve de recuar diante da repercussão negativa.

As propostas que mudam as regras do pagamento dos precatórios e de reformulação do Bolsa Família foram discutidas pelos ministros da Casa Civil, da Cidadania (João Roma), da Secretaria de Governo (Flávia Arruda) e pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

 

Reação. No mercado, há críticas pelo fato de a medida mirar o “curto prazo” eleitoral, sem observar as consequências para boa parte dos credores desses precatórios. Uma fonte do mercado observa que o direito de receber as dívidas judiciais é muitas vezes vendido por empresas em situação delicada (e muitas vezes sem acesso a crédito) para fazer caixa. Ao parcelar os precatórios e tornar o recebimento desses valores mais incerto, o governo comprometeria o funcionamento desse mercado e, no limite, deixaria empresas sem acesso a recursos novos.

Segundo apurou a reportagem, cerca de R$ 40 bilhões dos precatórios previstos para 2022 devem se enquadrar nas regras de parcelamento. Desse valor, 15% vão precisar ser pagos à vista, ou seja, ainda no ano que vem. O restante será parcelado – e, eventualmente, poderá ser antecipado com os recursos de fundo que o governo quer criar .

Um valor de R$ 89 bilhões para o pagamento dessas sentenças para 2022 foi repassado pelo Judiciário para a elaboração do Orçamento do ano vem, salto de R$ 33 bilhões em relação aos R$ 56 bilhões que o Ministério da Economia previa para as despesas com precatórios.

Na sexta, o Estadão mostrou que o “meteoro” que o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse querer acertar com um “míssil” era o pagamento dos precatórios. A despesa fica sob o guarda-chuva do teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação, e o governo já tem outras pretensões para o espaço disponível, como a reformulação do Bolsa Família.

Na defesa da PEC, Guedes tem dito que não se trata de confisco nem “pedalada”, porque existe precedente para Estados e prefeitos, que podem parcelar o pagamento dos precatórios. O ministro e sua equipe se dizem confiantes de que o Congresso e o STF vão garantir a “executabilidade” do Orçamento em 2022 e nos próximos anos.

 

Orçamento

R$ 89 bilhões

é quanto o governo deveria pagar em precatórios no ano que vem, conforme previsão do Judiciário enviada ao governo. A equipe econômica previa uma despesa de R$ 56 milhões

 

80%

das dívidas judiciais da União são de até R$ 66 mil

 

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Bolsonaro critica taxação de fortunas

 

O presidente Jair Bolsonaro criticou ontem a possibilidade de instituir imposto sobre grandes fortunas. "Alguns querem que eu taxe grandes fortunas no Brasil. É um crime agora ser rico no Brasil. Alguns querem que se aumente a carga tributária, que se tabele preços. Nós somos aquilo que nós produzimos", disse em discurso na cerimônia do lançamento do programa Água nas Escolas.

O Supremo Tribunal Federal (STF) analisa se há omissão do Congresso em aprovar lei para regular a taxação de grandes fortunas. O pedido foi apresentado pelo PT e PSOL. O presidente da Corte, Luiz Fux, ainda tem de marcar uma data para que a pauta seja discutida presencialmente pelos ministros. / GUSTAVO CÔRTES

 

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Pagamentos podem vir de novo fundo fora do teto de gastos


Economia quer propor criação de fundo com ativos da União para bancar quitação antecipada de dívidas

 

BRASÍLIA

 

O governo quer propor ao Congresso a criação de um fundo para quitar mais rapidamente os valores parcelados de precatórios, como são chamados os recursos devidos pelo poder público após sentença definitiva na Justiça. A despesa com o pagamento antecipado de parcelas usaria recursos desse fundo e ficaria fora do teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação.

A ideia é que o fundo seja formado por ativos da União, como empresas estatais que serão privatizadas, participações em empresas, recebíveis e imóveis. Esses ativos poderão ser usados para o pagamento antecipado de precatórios parcelados.

O parcelamento dessas dívidas judiciais foi proposto pelo governo como uma saída diante do crescimento dessa despesa previsto para 2022. Na elaboração da proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) do ano que vem, os precatórios estão estimados em R$ 89 bilhões, bem mais que os R$ 56 bilhões previstos para 2021, o que é considerado um "excesso" pela equipe econômica. Os valores são informados pelo Judiciário e vêm de ações em que a União foi derrotada.

Uma fonte do governo explicou ao Estadão que a previsão de recursos no Orçamento para o pagamento dos precatórios ficará dentro do teto de gastos, o que inclui as prestações previstas para cada ano. No entanto, sempre que houver uma antecipação de parcela usando o fundo, o valor não será contabilizado no limite de despesas no ano de sua quitação.

O entendimento é que não se trataria de uma despesa corrente, porque o credor do precatório vai ficar com um ativo do governo. Além disso, há a avaliação de que manter esses gastos antecipados poderia inibir a ação do governo de tentar acelerar as privatizações e alienações de imóveis com o objetivo de quitar a dívida.

"Só fica fora do teto o que for usado para a liquidação do fundo", explicou uma fonte da área econômica. Segundo essa fonte, trata-se de um ajuste patrimonial, como no caso de um precatório pago com "um pedaço" de uma estatal privatizada.

Segundo técnico ouvido pela reportagem, não haveria desconto no valor da dívida pela antecipação, apenas o benefício de acelerar o pagamento. / A.F. e I.T.