O Estado de S. Paulo, n. 46654, 12/07/2021. Economia, p. B7

A ponta do iceberg

Fabrizio Guerrato


A prorrogação do auxílio emergencial por mais três meses é apenas a ponta do iceberg. O gasto público deixou de ser o maior problema do governo Jair Bolsonaro. Com o alerta de emergência hídrica, o Brasil escancarou a crise no setor, consequência da maior seca em 91 anos. Até então, cinco Estados foram colocados em alerta: São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás e Paraná.

Historicamente, a matriz elétrica brasileira é predominantemente hídrica, ou seja, depende de chuva e segue com 72% de energia gerada pelas usinas hidrelétricas.

Entretanto, nos últimos anos, os reservatórios ficaram pressionados. Segundo relatórios do Inter Research, o subsistema Sudeste/centro-oeste, responsável por 70% do armazenamento, tem sido afetado desde 2020 pelo fenômeno La Niña, que causa alteração cíclica das temperaturas.

Essas mudanças podem provocar uma série de outros fenômenos, como aumento do calor, diminuição da chuva e secas. Isso sem falar que os reservatórios da região estão com 29% da sua capacidade total.

Para diminuir os efeitos dessa crise, a solução escolhida foi o acionamento das usinas termoelétricas, que funcionam a base da queima de combustível. Esse processo torna a ativação mais cara e o preço é repassado para o consumidor final, que sofre com a bandeira vermelha. Os preços da conta de luz já subiram no último mês, deixando a bandeira vermelha 52% mais cara, disse Bea Aguillar, do Canal Papo de Bolsa, durante a live QG do Mercado.

O Ministério de Minas e Energia estima que terá um custo de R$ 9 bilhões ao consumidor somente por ter acionado tais usinas. Esse valor será repassado, gerando um aumento de 5% no total da tarifa de luz.

Para alguns especialistas, a falta de alternativas às falhas do sistema hidrelétrico é um dos motivos desses acontecimentos, afinal, buscar uma alternativa em meio à crise é como enxugar gelo.

Podemos dizer que o aumento no valor da energia pode pressionar ainda mais a inflação, que já está em mais de 8% nos últimos 12 meses.

Além disso, existe incerteza sobre quais as proporções dos impactos da crise hídrica no País – o consenso entre analistas é de que existe um risco real de racionamento.

É importante salientar que empresas e setores que dependem da energia para a produção de seus produtos também serão indiretamente afetadas. É o caso do setor de extração mineral e papel e celulose.

Já do outro lado da crise, as empresas que trabalham diretamente com a energia renovável ou geradas por termoelétricas, podem ser até mesmo cases de oportunidade de curto, médio e longo prazos. Afinal, as ações das companhias podem disparar em tempos de crise hídrica, como é o caso da Eneva, campeã no setor.

As companhias elétricas de transmissão não devem sofrer tanto quanto as produtoras. Com histórico de serem ótimas pagadoras de dividendos, essas empresas possuem longos contratos, todos corrigidos com índices inflacionários, o que garante segurança para quem investe.

Por isso, empresas como a Taesa (TAEE11) e a Transmissão Paulista (TRPL4) não devem sofrer tanto com a crise e podem se tornar um porto seguro para muitos investidores.

Financista do 1 Bilhão Educação Financeira