Título: Trapalhada de R$ 2,8 bi
Autor: Kelly Oliveira
Fonte: Jornal do Brasil, 09/09/2005, Economia & Negócios, p. A17
Um equívoco acabou transformando o que seria uma boa notícia em mais uma trapalhada do governo. Depois de quase perder na votação do salário mínimo e sofrer uma derrota no aumento do funcionalismo, desta vez tropeçou na área tributária. O governo decidiu voltar atrás na decisão de reduzir a alíquota máxima do Imposto de Renda para pessoas físicas de 27,5% para 25%. A medida - incluída no Projeto de Lei Orçamentária de 2006 - ontem foi considerada um erro, percebido somente agora, duas semanas depois de o texto chegar ao Congresso.
A redução beneficiaria trabalhadores com salário superior a R$ 2.326 e representaria uma renúncia fiscal de R$ 2,8 bilhões por ano.
- A Receita errou - resumiu o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, responsável pelo envio do Orçamento ao Congresso.
O que o governo agora chama de erro consumiu algumas linhas da proposta de Lei Orçamentaria de 2006, com riqueza de detalhes.
''Acrescente-se a essas medidas a decisão do governo de não prorrogar a vigência da alíquota de 27,5% do Imposto de Renda incidente sobre a maior faixa de rendimentos, que voltará a ser de 25%'', diz o texto.
Segundo nota conjunta emitida ontem pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento, o equívoco ocorreu porque os técnicos da Receita se basearam na legislação antiga ao fazer as estimativas de receita. A alíquota para o próximo ano está estabelecida na Lei 11.119, de maio desse ano - conversão da polêmica MP 232, que corrigia a tabela do Imposto de Renda, mas elevava a carga tributária de alguns setores. Só que os técnicos se basearam na Lei 10.828 de 2003, que previa o término da vigência dos 27,5% em 31 de dezembro desse ano.
A nota informa ainda que o equívoco da Receita levou a Secretaria de Orçamento Federal, do Ministério do Planejamento, a supor que já estivesse concluída no âmbito do governo a discussão sobre desoneração tributária. E assim a redução foi incluída de última hora no texto da proposta orçamentária por Paulo Bernardo. O problema, segundo informou ontem o governo, é que a mudança da alíquota do IR para pessoa física nem sequer chegou a ser discutida pela equipe econômica.
O ministro afirmou ontem que o governo irá encaminhar uma mensagem ao Congresso para retificar a proposta. Do total de R$ 2,8 bilhões recuperados, R$ 1,53 bilhão será destinado a uma reserva de recursos para futuras medidas de desoneração tributária e R$ 1,36 bilhão para ampliação das transferências constitucionais aos Estados, Municípios e Fundos Constitucionais.
De acordo com a nota, as decisões sobre a desoneração tributária adicional e sobre a forma que será adotada só ocorrerá até dezembro desse ano.
- É uma decisão do presidente propor a redução - afirmou Paulo Bernardo.
Para tributaristas ouvidos pelo JB, o equívoco é injustificável. O governo não tem poder de alterar tributos via orçamento.
- Foi um erro de interpretação porque não há nenhuma previsão legal de redução do imposto para 25%. O Orçamento não tem poder de mudar, nem para mais nem para menos, a alíquota de impostos. Para isso, seria necessária a edição de uma lei ou medida provisória para ter validade - esclarece o advogado Sérgio Presta, do escritório Veirano Advogados.