O Estado de São Paulo, n. 46678, 05/08/2021. Política p.A8
Novo texto do voto impresso retira poderes do TSE
Camila Turtelli
Às vésperas de a proposta do voto impresso ser analisada pela comissão especial do Congresso, o relator do projeto, deputado Filipe Barros (PSLPR), protocolou ontem novo parecer sobre a medida. A versão ganhou um dispositivo que reduz o poder do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas investigações sobre processos de votação e outro que permite ao eleitor acompanhar a contagem manual de votos. Há ainda uma alteração que, segundo especialistas, derruba a regra de que as mudanças só poderiam ocorrer um ano após aprovadas, ou seja, elas teriam validade imediata e para 2022.
O texto tem previsão de ser analisado pela comissão especial hoje. Caso seja aprovado, vai ao plenário da Câmara. Se conseguir o apoio, em dois turnos, de três quintos da Casa (mínimo de 308 votos favoráveis), segue para o Senado. As mudanças apresentadas se dão no momento em que o presidente Jair Bolsonaro eleva o tom nas críticas à urna eletrônica, condicionando a realização das eleições à adoção do voto impresso.
Barros determina, no novo texto, que investigações sobre o processo de votação devem ser conduzidas de forma "independente" da autoridade eleitoral e que esse trabalho tem de ficar a cargo da Polícia Federal, "sendo a Justiça Federal de primeira instância do local da investigação o foro competente para processamento e julgamento". Ao Estadão/broadcast, o parlamentar afirmou que o dispositivo serve "para garantir investigações céleres e isentas". Ele também retirou um artigo da versão anterior que dizia que o TSE editaria normas e adotaria medidas para assegurar o sigilo do exercício do voto.
O deputado fez ainda mudanças para permitir que qualquer pessoa possa acompanhar a apuração manual dos votos, apesar de não detalhar como isso ocorreria. "A apuração consiste na contagem dos votos colhidos na seção eleitoral, publicamente por meio da presença de eleitores e fiscais de partidos, imediatamente após o período de votação e gera documento que atesta o resultado daquela seção eleitoral", diz o texto. "Apuração tem que ser pública. É ato administrativo. Apuração secreta só em ditaduras", declarou Barros.
Anualidade. Atualmente, qualquer mudança no processo eleitoral só pode começar a valer se tiver sido aprovada até, no máximo, um ano antes das eleições. É a chamada regra da anualidade. Essa norma está prevista na Constituição: "A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência". Barros quer acrescentar um "adendo": "A lei que verse sobre a execução e procedimentos dos processos de votação, assim como demais assuntos que não interfiram na paridade entre os candidatos, tem aplicação imediata".
Para técnicos legislativos, essa alteração pode fazer com que qualquer mudança aprovada em cima da hora passe a valer. Barros discordou. "Estamos só deixando mais claro o entendimento do próprio STF e TSE, de que aquilo que for relacionado a procedimento não precisa respeitar a anualidade e que essa regra só vale para o que puder gerar uma desigualdade entre os candidatos", disse.
O texto do relator prevê ainda que o transporte dos registros impressos de voto até a sede das autoridades estaduais eleitorais ficará a cargo das forças de segurança pública ou das Forças Armadas.
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O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-al), afirmou ontem que, embora não haja "nenhum fato relevante" que aponte fraude nas urnas eletrônicas, apoia o voto impresso nas próximas eleições. Lira falou em criar formas de auditagem "mais transparentes", que evitem contestações das eleições.
"Neste sistema, foram seis eleições. Eu não tenho nenhum fato relevante que eu possa falar que houve fraude nas urnas eletrônicas, eu não posso desconfiar de um sistema pelo qual fui eleito. Mas a discussão é: se não há falha, se não há problema, por que ficar discutindo essa versão? Por que essa versão cresce?", disse o deputado em entrevista à Rádio Bandeirantes.
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Lauriberto Pompeu
Em cerimônia de posse concorrida, o novo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (Progressistas-pi), pregou a pacificação do País e disse que atuará no governo como um "amortecedor" diante de tantas "trepidações". No Salão Nobre do Palácio do Planalto lotado de políticos, Nogueira afastou ameaças golpistas e disse que a democracia é "líquida e certa".
No momento em que o presidente Jair Bolsonaro protagoniza um embate com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por causa do voto impresso, o novo ministro da Casa Civil e líder do Centrão afirmou que sua tarefa, a partir de agora, será trabalhar para diminuir as tensões entre os Poderes. "É nosso dever preparar o País para chegar às eleições com a economia recuperada e a vacinação garantida."
"A política muitas vezes provoca choques, tremores, abalos. Gostaria que toda vez que Vossa Excelência me visse, lembrasse de um amortecedor. O meu nome é temperança e o meu sobrenome tem de ser equilíbrio", afirmou Nogueira, dirigindo-se a Bolsonaro. O novo ministro, definido como "alma do governo" pelo presidente, citou várias vezes a palavra democracia no discurso de posse. "É por ela que todos nós estamos aqui, presidente. É por ela que o senhor está aqui. Para zelarmos por ela."
A cerimônia que marcou a entrada oficial do Centrão no governo contou com um amplo leque de representantes políticos. Muitos estavam sem máscara de proteção contra covid19. Na terça-feira, 3, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) esteve no gabinete de Nogueira. Nesta quarta, do Val divulgou nas redes sociais que exame de covid feito por ele deu positivo, pela segunda vez.
Bolsonaro disse que a nomeação de Nogueira foi um ato de apoio ao Legislativo. "A chegada agora do Ciro Nogueira é uma demonstração, por parte do governo, de que nós queremos cada vez mais aprofundar o relacionamento com o Parlamento", afirmou. "Não é a primeira vez que eu digo que Legislativo e Executivo, na verdade, são um só Poder".
Ao fim de seu pronunciamento, o chefe da Casa Civil repetiu um bordão da campanha eleitoral de Bolsonaro em 2018. "O Brasil acima de tudo e Deus acima de todos. Viva o povo brasileiro!", afirmou.