O Globo, n. 32768, 25/04/2023. Economia, p. 14

Fazenda vai divulgar CNPJs com isenções fiscais

Manoel Ventura
Renan Monteiro
Gian Amato


O Ministério da Fazenda prepara a divulgação de uma lista de todas as empresas brasileiras beneficiadas por isenções e benefícios fiscais federais. A expectativa internamente é começar a divulgação dessa lista na próxima semana ou, no máximo, em 15 dias. Isso seria feito em dois blocos, mas os critérios ainda estão sendo fechados.

O ministro Fernando Haddad disse, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, que pretende divulgar “CNPJ por CNPJ” das empresas que hoje são beneficiadas. Ele afirmou que a meta é cortar R$ 150 bilhões dessas renúncias tributárias. No total, segundo o ministro, há R$ 600 bilhões em benefícios deste tipo hoje no país, chamados por ele de uma caixa-preta “maior que o orçamento secreto”.

Na entrevista, Haddad afirmou que seus planos de rever benefícios fiscais não incluem mexer no Simples nem na desoneração das folhas de pagamento.

Em conversa com jornalistas ontem, o chefe da equipe econômica se manifestou contra fixar uma punição ao presidente da República por eventual descumprimento das metas de resultado das contas públicas. O novo arcabouço fiscal não prevê punição caso o resultado fiscal que o governo deve perseguir seja descumprido. O resultado é calculado pela diferença entre receitas e despesas do governo.

Pelo projeto, caso haja descumprimento, o presidente da República precisará explicar os motivos ao Congresso, por meio de uma carta que também deverá apontar medidas de correção. Além disso, o crescimento das despesas no ano seguinte seria menor.

Lula volta a criticar juro

Haddad comparou o mecanismo ao da meta de inflação. O Banco Central (BC) precisa perseguir um índice, definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e que varia dentro de um limite mínimo e máximo. Quando a inflação fica abaixo ou acima desse intervalo, o chefe do BC precisa fazer uma carta se justificando.

— Ninguém pune o Banco Central por descumprir a meta. O que eu acredito é você ter regras que tornem a gestão fiscal mais rígida. Não conheço nenhum país que criminalize. Do que adianta você fazer uma regra dura, como o teto de gastos, e depois ficar aprovando emendas constitucionais e furando o teto. Melhor ter uma regra sustentável —comentou Haddad, citando, por outro lado, que o Congresso tem autonomia para decidir por possíveis mudanças.

Nos anos de 2021 e 2022, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou fora do intervalo de meta estabelecido. Há perspectiva de a inflação continuar fora do limite máximo também em 2023. A meta de inflação para este ano é de 3,25%, com teto de 4,75%. O principal instrumento do BC para controlar a inflação é a Taxa Selic, hoje em 13,75% ao ano, motivo de crítica pelo governo.

Ontem, em Portugal, o presidente Lula afirmou que a Selic a 13,75% ao ano é muito alta e que ninguém toma dinheiro emprestado com esse percentual.

— A verdade é que um país capitalista precisa de dinheiro, e esse dinheiro tem que circular na mão de todos — disse. — A solução do Brasil é a gente voltar a pôr o pobre no Orçamento. É garantir que as pessoas pobres podem comprar.

Com atenção ao resultado das contas públicas para os próximos anos, Haddad esteve durante a manhã de ontem com o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Benedito Gonçalves. O magistrado é relator do processo que discute a exclusão dos benefícios do ICMS da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Relator vai negociar texto

Para Haddad, o julgamento do STJ pode “mudar completamente o horizonte fiscal do país”. De acordo com o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2024, a decisão tem impacto estimado de R$ 47 bilhões no ano que vem.

— Isso tem um impacto muito grande nas finanças públicas, que estão sendo corroídas por uma série de dispositivos anômalos e completamente ilegítimos, que estão corroendo a base fiscal do Estado —afirmou o ministro.

Em outra frente, o relator do projeto do arcabouço fiscal, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), começa hoje uma série de reuniões para fechar o texto final da proposta. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pretende votar o projeto até 10 de maio.

Cajado terá reuniões hoje com as bancadas do seu próprio partido, que se classifica como independente, e do União Brasil. Juntos, os dois partidos têm 108 deputados. O governo precisa de pelo menos 257 votos a favor, entre 513 deputados.