Título: Mata dominada pelo tráfico
Autor: Ricardo Albuquerque
Fonte: Jornal do Brasil, 10/09/2005, Rio, p. A13

O constante deslocamento de traficantes pelas matas dos morros cariocas, na tentativa de fugir dos cercos policiais, levou a Comissão de Meio Ambiente da Alerj a elaborar um dossiê que denuncia a influência do tráfico de drogas em áreas de preservação ambiental. O relatório mostra que o Parque Nacional da Tijuca serve de esconderijo, campo de observação e ponto de captura de animais silvestres, vendidos em feiras clandestinas. O documento - em fase de finalização - aponta a expansão desordenada das favelas e a falta de preparo dos agentes da lei para atuar em regiões montanhosas como os principais obstáculos encontrados pelas polícias Civil e Militar para evitar a migração de traficantes entre as favelas.

As trilhas abertas por traficantes nas matas já foram constatadas por especialistas do Batalhão Florestal, por policiais do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e agentes das delegacias de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais (Draco) e de Protenção ao Meio Ambiente (DPMA). Levantamentos preliminares feitos pelos policiais das duas unidades foram entregues à Secretaria Estadual de Segurança Pública, que usará os documentos para elaborar novas estratégias de ação no combate ao narcotráfico.

O comandante-geral da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, coronel Hudson de Aguiar Miranda, admitiu ontem que é impossível cobrir todas as rotas de fuga dos traficantes nas mais de 700 favelas da cidade, em particular nas que são separadas apenas por mata, como ocorre com Vidigal e Rocinha. Em menos de uma semana, quatro pessoas foram mortas na guerra do tráfico entre facções criminosas no Morro do Vidigal. Os integrantes da facção Amigos dos Amigos (ADA), da Rocinha, se deslocaram pelas matas do Parque Ecológico na tentativa de tomar a distribuição de drogas.

Há duas semanas, os traficantes da Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, escaparam do cerco do Bope e do 19º BPM (Copacabana) ao fugirem para o Dona Marta, em Botafogo. De lá, seguiram pela mata até o Cerro-Corá, no Cosme Velho, e chegaram ao Morro dos Prazeres, em Santa Tereza, sem precisar utilizar o asfalto.

O comandante do Bope, coronel Fernando Príncipe, também reconhece a dificuldade de conter as rotas de fuga, e acredita que os danos causados ao meio ambiente são muito maiores do que se tem notícia.

- Ano passado prendemos um traficante na Rocinha com vários animais silvestres. Suspeitamos que, além de usarem as matas em volta dos morros para escaparem, eles degradam a fauna e a flora de nossas matas - observa Príncipe.

Para o comandante do Bope, os governos deveriam criar sistemas que impedissem a ocupação desordenada do solo, para frear o desmatamento e a má utilização de áreas ambientais. Segundo ele, o crescimento acelerado das favelas é conseqüência de uma série de problemas, como a falta de moradia e o desemprego - questões que não são resolvidas com operações policiais.

- As favelas crescem silenciosamente, por isso a importância de ações sociais e educacionais nessas áreas para conter o avanço antes que, no futuro, a Floresta da Tijuca desapareça - avisa Príncipe.

A denúncia do relatório da Alerj vai sugerir a ocupação inteligente da Floresta da Tijuca e do Maciço da Pedra Branca, além da demarcação de limites para o crescimento de favelas, como soluções para combater a invasão desordenada. O treinamento para os policiais civis e militares atuarem em locais de difícil acesso também faz parte das sugestões do documento.

- Falta pouco para a Rocinha encostar no Vidigal e se tornar uma só comunidade. É preciso demarcar um limite para impedir o avanço da ocupação de forma tão hostil ao meio ambiente - diz o deputado André do PV, vice-presidente da Comissão de Meio Ambiente da Alerj e relator do documento.

A oitava unidade do Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais (GPAE) será inaugurada na Rocinha, atuando em parceria com um destacamento fixo do Batalhão Florestal. O objetivo é coibir o tráfico de drogas e animais silvestres no trecho que restou de Mata Atlântica. O GPAE atua em sete comunidades: Formiga, Casabranca, Chácara do Céu, Cavalão (Niterói), Vila Cruzeiro, Pavão-Pavãozinho e Cantagalo.