Título: Aécio rearticula a 'República de Minas'
Autor: Janaína Leite
Fonte: Jornal do Brasil, 04/11/2004, País, p. A-4

Governador tucano circula com desenvoltura entre petistas e empresários e ganha apoio velado na campanha para presidente Acostumada a um clima modorrento na baixa temporada, a cidade histórica de São João Del Rey viveu um dia atípico na última sexta-feira, 29 de setembro. Uma pequena multidão se espremeu nas ruas de pedra para ver quem era a celebridade que dirigia uma van que parecia ter saído diretamente de um comercial de aventureiros. A surpresa ao ver o motorista em mangas de camisa, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, era substituída na maioria das vezes por sorrisos e acenos. Um eleitor mais entusiasmado não se conteve e saudou o ''próximo presidente''. Aécio, matreiro, voltou-se aos companheiros no passeio: - É muito mais gostoso fazer política quando não tem eleição e o adversário não está por perto - constatou.

Os tucanos do PSDB, partido de Aécio, já se entregaram a vôos rasos e bicadas certeiras. Mas ninguém se engane que o jeito dele - mineiro até os ossos, como convém ao herdeiro político do presidente Tancredo Neves - significa retração na briga pela candidatura à presidência da República, marcada para 2006. Isso porque os senhores do ringue escolhido por Aécio, os bastidores da economia, enxergam em Minas Gerais boas oportunidades de negócio.

- O trabalho parceiro ainda é a melhor estrada para enfrentarmos juntos os desafios - afirmou o presidente da Federação das Indústrias de Minas, Robson Andrade, referindo-se à iniciativa de incrementar o turismo local.

- Não percebo nenhum grupo de pessoas (empresários e governo) mais determinado e competente do que os de Minas - desmanchou-se Aécio.

Neste mês, desembarca por lá uma missão empresarial vinda da China. Os orientais estão interessados em exportar 100 milhões de turistas a cada ano, um número 20 vezes maior do que o Brasil inteiro recebe no mesmo intervalo de tempo. Encontrarão os secretários de estado preparados - até cartão de visitas em chinês para a equipe o governador mandou fazer.

- Aécio tem muita visão - disse ao JB o superintendente da Fiat na América Latina, Cledorvino Belini, responsável pelo passeio motorizado do governador.

Aécio desembarca em Brasília até o final do mês. Em uma mão leva as contas do Estado, cujo déficit foi brutalmente reduzido desde que assumiu. Até 1º de janeiro, estima, receitas e despesas estarão equilibradas. Na outra, notícias de parcerias com chineses, japoneses e brasileiros em projetos de infra-estrutura.

- Aécio é lobo em pele de carneiro. Está fechando acordos de gaveta com o vice-presidente, José Alencar, e com o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. É a república de Minas, que se dá muito melhor do que os políticos de São Paulo. Essa leitura de que ele está fraco é ingênua demais. Aécio quer levar turistas para lá não só para conhecer Minas, mas para ficar mais conhecido por gente de todo o Brasil - avalia um dirigente do PSDB paulista, que participou da equipe de Fernando Henrique Cardoso.

A proximidade com o PT pode não ser tão grande como acusam os paulistas, mas certamente deve render frutos políticos a Aécio. No mesmo dia em que ele fazia marketing de Minas dirigindo um Fiat Doblò Adventure da série especial Estrada Real, o chefe da Casa Civil, José Dirceu, desembarcou em Belo Horizonte. O objetivo era uma reunião com empresários locais. Durante o encontro, Dirceu elogiou Aécio para os industriais e prometeu dinheiro para erguer obras de infra-estrutura no Estado.

- Temos uma boa interlocução com o governador de vocês - teria revelado o ministro a um dos empresários.

Para garantir sua candidatura, no entanto, Aécio terá de enfrentar adversários de peso. Enquanto ele tem bom trânsito no setor produtivo e ainda engatinha rumo aos banqueiros, Alckmin vem sendo procurado por instituições financeiras de outros países - as mesmas que balizaram muitos negócios da gestão FH.

São parceiros de peso, pois, além de grandes financiadores de campanha, constituem a fina flor em investimentos de grande porte. Com os fundos de pensão mais próximos ao governo do PT, os grandes bancos tornam-se os segundo alvo dos políticos, junto com as operadoras de telefonia e as empresas de siderurgia e mineração.

Minas Gerais, por exemplo, abriga 20% das linhas ferroviárias no País. Aécio tem feito um grande esforço para aumentar o percentual. Parte dos investimentos, inclusive, deve seguir para a região de Serra do Tigre.

Dizia o presidente Tancredo Neves que cada governo tem a oposição que merece. O racha entre os tucanos é, portanto, um espelho do que acontece no PT, onde o excesso de candidatos está escondido sob a fumaça das escaramuças no Planalto, Fazenda e Banco Central.