Título: Segurança alimentar para os índios
Autor: Paulo Lustosa
Fonte: Jornal do Brasil, 11/09/2005, Outras Opiniões, p. A11

Uma das preocupações básicas hoje da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) diz respeito à necessidade de superar urgentemente as graves dificuldades provocadas pela desnutrição, vividas não apenas pelas populações indígenas de Mato Grosso do Sul, mas por grande parte das 181 mil aldeias espalhadas pelo país, onde vivem cerca de 440 mil índios. Esta situação é bem conhecida pela sociedade, principalmente pelo grande número de matérias de alerta publicadas na imprensa nos últimos tempos.

O problema, como vários outros vividos por essas populações, decorre do chamado choque civilizatório. A partir dos primeiros encontros com outros segmentos sociais, as relações de contato alteram profundamente as formas tradicionais de ocupação territorial desses povos, obrigando-os, quase sempre, a um reordenamento demográfico, em função de constantes deslocamentos das comunidades, por razões as mais variadas.

Assim, o índio, por natureza nômade, sofre um grande impacto com relação à disponibilidade de alimentos, principalmente no tocante à pesca, caça e coleta, pois muitas vezes é praticamente empurrado para áreas limítrofes de centros urbanos ou grandes fazendas, onde os recursos naturais há muito foram extintos.

Em decorrência, o que se vê atualmente é um índice crescente de desnutrição nas áreas indígenas, como uma das maiores causas da mortalidade infantil, provocada por pneumonias e diarréias. E, como conseqüência, um impacto direto nos custos com a saúde, obrigando os doentes a constantes deslocamentos das aldeias, para internamento hospitalar.

Procurando uma solução para o problema, dentro de uma agenda positiva intersetorial, a Funasa está executando um programa de promoção à segurança alimentar e nutricional, com ações imediatas voltadas aos desnutridos. Essas ações são frutos de um termo de cooperação firmado este ano entre o órgão, o Ministério de Desenvolvimento Social e a Funai, para a distribuição de cestas de alimentos para 16.768 famílias de comunidades localizadas em áreas consideradas críticas e que necessitam também de vigilância e controle na distribuição dos alimentos.

O programa visa ainda incentivar o desenvolvimento de atividades sustentáveis, numa ação conjunta com os órgãos envolvidos no programa Fome Zero, compondo o conjunto das políticas de governo voltadas para a concretização do direito humano e universal à alimentação e nutrição adequadas, num panorama que contemple e respeite a cultura alimentar indígena.

Assim, uma das prioridades é fortalecer as ações do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), programa que tem como objetivo diagnosticar e acompanhar a situação de cada grupamento. Só assim será possível prever as tendências das condições de alimentação e nutrição das aldeias, estabelecendo campanhas políticas, programas e intervenções.

Para este ano a meta é que o Sisvan atinja 21 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) considerados prioritários, dando cobertura a 53.012 crianças de zero a cinco anos e 95.055 mulheres em idade fértil. Em 2006 a cobertura deverá ser total, com o desenvolvimento dos trabalhos nos Dseis restantes.

Para dar sustentação às ações, a Funasa disponibilizou em seu site, para consulta pública, a ''Norma Operacional de Vigilância Alimentar e Nutricional''. O objetivo do documento é fornecer subsídios técnicos e conceituais para a implantação da vigilância nos Dseis. A expectativa é que a norma funcione como um instrumento para promover a mudança das condições nutricionais e de saúde dos índios, melhorando gradativamente sua condição de vida.