Título: Tábua de salvação
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/09/2005, País, p. A3

Pressionado por uma forte articulação política que busca destituí-lo do cargo, o deputado se encontrou com o coordenador político do governo, ministro Jaques Wagner, antes de conceder uma entrevista coletiva de pouco mais de uma hora.

O ministro, no entanto, disse ontem ao presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), que o governo não interferirá na apuração da denúncia de recebimento de propina de R$ 110 mil, pelo deputado, em troca da prorrogação de um contrato de exploração de restaurante localizado em um dos anexos da Casa.

Em encontro realizado a pedido de Severino, Wagner afirmou que o caso tem de ser resolvido pelos próprios parlamentares. Confrontado com a defesa apresentada pelo presidente da Câmara dos Deputados, o ministro acrescentou que o governo não fará pré-julgamento.

- Apesar das explicações, o governo mantém a posição de não interferir, pois se trata de uma questão interna da Câmara - declarou o ministro.

A posição do Planalto não impediu Severino Cavalcanti de imprimir um discurso otimista na entrevista coletiva concedida depois do encontro.

- Claro que tenho apoio do governo se meu partido dá apoio ao governo. Tenho certeza de que o governo me dará toda a cobertura porque está do lado da verdade - disse o presidente da Câmara.

Antes, no entanto, Severino resistiu a dar detalhes sobre a conversa. Primeiro, afirmou que o ministro estaria interessado em saber sobre o desempenho dele na viagem oficial aos Estados Unidos, para uma reunião da Organização das Nações Unidas (ONU). Depois, diante da insistência dos jornalistas, demonstrou irritação.

- Não tenho obrigação de falar sobre minha conversa com ele - afirmou Severino.

O presidente chegou a discutir com jornalistas que insistiam em certas perguntas, especialmente quando foi questionado sobre seu encontro com o ministro.

- O governo tem certeza absoluta de que não estou dentro desse enlameado que tentaram lançar em meu nome - disse. Ele afirmou, entretanto, que nada faz para atrair o presidente Lula.

- Eu não vou fazer nenhum ato para sensibilizar o presidente. Ele que cumpra com o dever dele, que eu cumprirei com o meu - desconversou.

Sobre os governistas no Congresso, que vacilam entre ele e a oposição, Severino disse ter certeza de que os conquistou após a entrevista de ontem.

-Eles viram a minha posição, a minha correção, não titubeei em nenhum momento. Nenhum. - afirmou. Com o dedo em riste diante das câmeras de TV, Severino diz ser vítima de uma ''armação solerte e desavergonhada'', criticou a ''indústria do denuncismo que se instalou no país'' e deu sucessivos tapas na mesa enquanto rechaçava as denúncias contra ele:

- Mentiras! Mentiras! Mentiras!

Desde a semana passada, os líderes dos partidos da base aliada ao governo e da oposição negociam a fim de encontrar um nome de consenso para suceder o presidente da Câmara caso ele não resista no posto. O candidato ideal ainda não foi encontrado, mas há uma convergência sobre a necessidade de o escolhido ter bom trânsito entre governistas e oposicionistas.

Na última sexta-feira, um dia depois de deixar vazar sua predileção pelo líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), o Palácio do Planalto colocou um pé no freio e disparou telefonemas para a oposição se dizendo desinteressado em entrar numa disputa pela vaga do deputado Severino Cavalcanti Não que o governo tenha desistido de trabalhar para emplacar um petista na presidência da Câmara. Mas sabe que o respeito ao princípio da proporcionalidade - segundo o qual a maior bancada, no caso o PT, tem o direito de indicar o presidente - passa por um amplo acordo. Não seria prudente precipitar as negociações num momento de crise.

- Quem entrar na lógica de impor nomes nesse momento dará com os burros n'água - alertou o deputado federal Eduardo Paes (PSDB-RJ).